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Vai acabar o voto secreto no Congresso?


04.09.2006



Coluna do IG O presidente da Câmara. Aldo Rebelo, está decidido a colocar em votação, no esforço concentrado desta semana, o projeto de emenda constitucional (PEC) que acaba com o voto secreto de deputados e senadores. Nas conversas preliminares, os líderes dos principais partidos apoiaram a idéia, pois avaliam que é preciso fazer algum a coisa para melhorar a debilitadíssima imagem do Congresso. Mas, apesar do empenho de Aldo e dos líderes, a emenda dificilmente será aprovada agora, pelo menos tal como está redigida, ou seja, extinguindo o voto secreto dos parlamentares em todos os casos. E por várias razões ... A primeira é que é sempre difícil aprovar emendas constitucionais. Afinal, elas só saem do terreno das boas (ou más) intenções se contam com o apoio de 60% dos membros da Câmara e do Senado, por duas vezes, em votações separadas nas duas casas. Dando números aos bois: 308 deputados e 51 senadores, num total de 513 e 81, respectivamente. Por iss mesmo, em geral, as emendas constitucionais precisam ser muito negociadas antes de ir a voto no plenário. Não foi o caso da PEC que está para ser apreciada. Segunda razão: a aprovação da PEC contraria diretamente os interesses dos quase 70 deputados acusados de envolvimento no escândalo dos sanguessugas, que, é claro, preferem ser julgados pelos seus pares pelas regras atuais. Portanto, será preciso um quorum de final de Copa do Mundo – algo como 470 ou 480 deputados e mais de 70 senadores – para atropelar a resistência da turma que está na marca do pênalti. Esse pessoal não precisa nem pedir aos amigos que se exponham votando contra a PEC no painel eletrônico. Basta que eles deixem o plenário na hora da votação, ajudando a derrubar o quorum. Terceira razão: mesmo que a emenda seja aprovada na Câmara nesta semana, dando-se assim uma satisfação à opinião pública, ela terá enormes dificuldades para passar no Senado mais tarde. O espírito de corpo da câmara alta tende a falar mais alto. Há três casos em que a Constituição prevê o voto secreto de parlamentares: a) processos de cassação de mandatos; b) apreciação de vetos do presidente da República a leis aprovadas no Congresso; c) ratificação ou rejeição de nomes de autoridades indicadas pelo Poder Executivo, como ministros de tribunais superiores, embaixadores, diretores do Banco Central e de agências reguladoras etc. Nesse último caso, é bom lembrar, apenas o Senado delibera. E o voto secreto, ao contribuir para tornar mais imprevisíveis as decisões, aumenta o poder de barganha dos senadores na mesa de negociações. Não foi à toa que o presidente do Senado, Renan Calheiros, deu entrevista na semana passada dizendo que só aceita o fim do voto secreto para cassações de mandato. Recorrendo a uma cortina de fumaça, Renan argumentou que, sem o voto secreto, os parlamentares serão submetidos a pressões insuportáveis na apreciação dos vetos presidenciais. É um argumento que não se sustenta. Na ditadura, essa proteção ainda fazia algum sentido, pois, com a opinião pública subjugada, o congressista ficava indefeso diante do Palácio do Planalto. Mas hoje em dia, ocorre o contrário. Mais do que proteger o parlamentar de eventuais pressões do Poder Executivo, o voto secreto blinda o deputado ou o senador das pressões da sociedade. E mais: favorece o jogo de seduções e o toma-lá-dá-cá por detrás do pano. Não há motivo algum, numa democracia, para a existência de um dispositivo que impeça o eleitor de saber como votou o parlamentar a quem ele delegou um mandato. O resto é conversa mole para boi dormir ... Assim, não será fácil aprovar a PEC. O mais provável é que, para emplacar o fim do voto secreto nos processos de cassação, tenham de ser feitas concessões, mantendo-o ainda nos casos de apreciação de vetos e de votação de nomes de autoridades. Talvez seja o preço a pagar. Concilia-se naquilo que pode ficar para amanhã, para se avançar naquilo que tem de ser resolvido agora. Como diz o ditado, a cada dia, sua agonia. Mas que não venham com essa história de o voto secreto do parlamentar faz bem ao Congresso e à democracia.

Vai acabar o voto secreto no Congresso?


04.09.2006



Coluna do IG O presidente da Câmara. Aldo Rebelo, está decidido a colocar em votação, no esforço concentrado desta semana, o projeto de emenda constitucional (PEC) que acaba com o voto secreto de deputados e senadores. Nas conversas preliminares, os líderes dos principais partidos apoiaram a idéia, pois avaliam que é preciso fazer algum a coisa para melhorar a debilitadíssima imagem do Congresso. Mas, apesar do empenho de Aldo e dos líderes, a emenda dificilmente será aprovada agora, pelo menos tal como está redigida, ou seja, extinguindo o voto secreto dos parlamentares em todos os casos. E por várias razões ... A primeira é que é sempre difícil aprovar emendas constitucionais. Afinal, elas só saem do terreno das boas (ou más) intenções se contam com o apoio de 60% dos membros da Câmara e do Senado, por duas vezes, em votações separadas nas duas casas. Dando números aos bois: 308 deputados e 51 senadores, num total de 513 e 81, respectivamente. Por iss mesmo, em geral, as emendas constitucionais precisam ser muito negociadas antes de ir a voto no plenário. Não foi o caso da PEC que está para ser apreciada. Segunda razão: a aprovação da PEC contraria diretamente os interesses dos quase 70 deputados acusados de envolvimento no escândalo dos sanguessugas, que, é claro, preferem ser julgados pelos seus pares pelas regras atuais. Portanto, será preciso um quorum de final de Copa do Mundo – algo como 470 ou 480 deputados e mais de 70 senadores – para atropelar a resistência da turma que está na marca do pênalti. Esse pessoal não precisa nem pedir aos amigos que se exponham votando contra a PEC no painel eletrônico. Basta que eles deixem o plenário na hora da votação, ajudando a derrubar o quorum. Terceira razão: mesmo que a emenda seja aprovada na Câmara nesta semana, dando-se assim uma satisfação à opinião pública, ela terá enormes dificuldades para passar no Senado mais tarde. O espírito de corpo da câmara alta tende a falar mais alto. Há três casos em que a Constituição prevê o voto secreto de parlamentares: a) processos de cassação de mandatos; b) apreciação de vetos do presidente da República a leis aprovadas no Congresso; c) ratificação ou rejeição de nomes de autoridades indicadas pelo Poder Executivo, como ministros de tribunais superiores, embaixadores, diretores do Banco Central e de agências reguladoras etc. Nesse último caso, é bom lembrar, apenas o Senado delibera. E o voto secreto, ao contribuir para tornar mais imprevisíveis as decisões, aumenta o poder de barganha dos senadores na mesa de negociações. Não foi à toa que o presidente do Senado, Renan Calheiros, deu entrevista na semana passada dizendo que só aceita o fim do voto secreto para cassações de mandato. Recorrendo a uma cortina de fumaça, Renan argumentou que, sem o voto secreto, os parlamentares serão submetidos a pressões insuportáveis na apreciação dos vetos presidenciais. É um argumento que não se sustenta. Na ditadura, essa proteção ainda fazia algum sentido, pois, com a opinião pública subjugada, o congressista ficava indefeso diante do Palácio do Planalto. Mas hoje em dia, ocorre o contrário. Mais do que proteger o parlamentar de eventuais pressões do Poder Executivo, o voto secreto blinda o deputado ou o senador das pressões da sociedade. E mais: favorece o jogo de seduções e o toma-lá-dá-cá por detrás do pano. Não há motivo algum, numa democracia, para a existência de um dispositivo que impeça o eleitor de saber como votou o parlamentar a quem ele delegou um mandato. O resto é conversa mole para boi dormir ... Assim, não será fácil aprovar a PEC. O mais provável é que, para emplacar o fim do voto secreto nos processos de cassação, tenham de ser feitas concessões, mantendo-o ainda nos casos de apreciação de vetos e de votação de nomes de autoridades. Talvez seja o preço a pagar. Concilia-se naquilo que pode ficar para amanhã, para se avançar naquilo que tem de ser resolvido agora. Como diz o ditado, a cada dia, sua agonia. Mas que não venham com essa história de o voto secreto do parlamentar faz bem ao Congresso e à democracia.

“Olha o vôo da galinha aí, gente”


01.09.2006



Coluna do IG Os ataques mais duros lançados contra Lula nos últimos dias não partiram nem de Geraldo Alckmin, nem de Heloísa Helena, mas da própria realidade. Mais especificamente, da economia. Foram três os tirambaços. Primeiro, o desemprego voltou a subir em julho de acordo com o IBGE, atingindo a marca de 10,7%, a maior em 15 meses. Segundo, a Volkswagen anunciou pesadas demissões em sua unidade de São Bernardo do Campo, bastião e símbolo do sindicalismo moderno que impulsionou o nascimento do PT, e avisou que pode fechar a fábrica. Terceiro, saiu o PIB do segundo trimestre. O crescimento, de apenas 0,5%, surpreendeu até os mais pessimistas, ganhando imediatamente o apelido de “Pibinho”. Fez por merecer. As três notícias ruins explicam por que o Copom, na última quarta-feira, cortou em 0,5% a taxa de juros, deixando pasmo o mercado financeiro, que, acostumado ao conservadorismo do Banco Central, apostava numa queda menor ainda, de 0,25%. Na verdade, a ousadia do BC não teve nada de ousadia. Foi apenas uma tentativa de injetar ânimo à recuperação da atividade econômica, que está se dando de forma muito mais lenta e errática do que se esperava. Tudo bem, o ambiente macroeconômico é bom, os fundamentos estão em seus lugares, o país está pronto para um período de crescimento sustentado, mas algo até agora obscuro impede a economia de levantar vôo. José Serra, que, embora candidato a governador de São Paulo, gosta mais de falar sobre os problemas nacionais do que os do seu estado, botou imediatamente o dedo na ferida: “É o vôo da galinha, porque a economia ameaça andar e não anda por causa dessa política monetária e cambial". Alckmin foi menos preciso no diagnóstico e nos números, porém mais contundente na crítica: “O Brasil é o lanterninha do crescimento. O Brasil anda para trás, enquanto países emergentes, a América Latina, crescem mais de 6%”. Heloísa Helena, para variar, adjetivou: “O crescimento pífio é o retrato da escolha da política econômica pelo governo, que é uma sabotagem ao desenvolvimento”. Do outro lado, o governo caiu na defensiva. Houve até quem dissesse que o baixo crescimento da economia no período deveu-se aos dias parados por conta dos jogos do Brasil na Copa do Mundo. Ufa! Ainda bem que fomos eliminados nas quartas de final. Se fossemos campeões, certamente estaríamos amargando um PIB negativo no trimestre. Essas e outras explicações mambembes apenas ilustram o atordoamento do governo diante da onda de más notícias da economia. A dúvida que fica agora é sobre o impacto dessas más notícias sobre o ambiente eleitoral. É evidente que os problemas e as incertezas da economia dão munição à oposição, mas não está claro se serão suficientes para provocar mudanças nas intenções de voto dos eleitores. Afinal, o anúncio de índices medíocres de crescimento, por si só, não afeta imediatamente o cotidiano das pessoas. No máximo, tem efeito a médio prazo. “O povo não come estatísticas”, disse-me ontem um auxiliar de Lula. Mesmo admitindo que o PIB pífio foi um golpe, ele acredita que o governo tem como enfrentar o debate e conter eventuais perdas eleitorais. A conferir. De qualquer forma, o país sairia lucrando se os principais candidatos aproveitassem a decepção com o PIB do segundo trimestre para discutir os méritos e os riscos da atual política econômica, saindo do terreno das generalidades e dos chavões. Devemos manter o regime de metas de inflação? O câmbio flutuante transformou-se numa armadilha e deve sofrer algum tipo de restrição, ou o país deve perseverar nesse caminho? A política monetária deve sofrer alterações na sua essência ou seria um desatino fazer mudanças drásticas agora, quando os resultados estão prestes a ser colhidos e o país já pagou o preço pelo ajuste? O Estado brasileiro cabe no PIB? O governo gasta demais com o custeio da máquina ou com a conta de juros? São perguntas difíceis de responder, mas a tentativa de respondê-las certamente contribuiria muito para a elevação da qualidade do debate eleitoral. Do que andamos muito precisados.

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