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Na economia, a Belíndia. Na campanha eleitoral, o Suiraque


17.10.2006



Coluna do iG O final da tarde de ontem foi excepcionalmente tenso em Brasília. Os presidentes dos partidos que apóiam Alckmin, depois de colocar em suspeição a investigação da Polícia Federal sobre o dossiê, anunciaram que pedirão à OAB para monitorar o trabalho da PF e ao Tribunal Superior Eleitoral para exigir do Ministro da Justiça explicações sobre uma suposta “operação-abafa”. A resposta do governo foi imediata. Márcio Thomás Bastos acusou a oposição de querer privatizar as investigações, lembrando que elas já estão sendo acompanhadas pelo Ministério Público e pela Justiça. O comando da campanha de Lula foi mais longe: acusou os partidários de Alckmin de querer desacreditar as instituições e desestabilizar o processo eleitoral, com o objetivo de questionar mais tarde na Justiça uma eventual de vitória de Lula. A decisão da oposição de partir para a ofensiva foi tomada numa reunião realizada no domingo em São Paulo com a presença do próprio Alckmin. No encontro, a avaliação predominante foi a de que Lula havia recuperado a iniciativa política e de que a campanha do tucano encontrava-se na defensiva, tendo de responder diariamente às acusações dos adversários. As pesquisas de opinião, que apontam larga vantagem para o presidente, refletiriam essa situação. Para virar o jogo, seria fundamental recolocar o caso do dossiê no centro do debate eleitoral. Tal tarefa, entretanto, não deveria ser assumida diretamente por Alckmin, para que não se reforçasse a imagem de um candidato com campanha negativa. Caberia aos presidentes do PSDB e do PFL e a parlamentares de ambos os partidos partir para esse tipo de enfrentamento. No meio da tarde, a luz amarela acendeu no comando da campanha de Lula. De início, houve divergências na avaliação do sentido do movimento da oposição. Para alguns, a escalada da campanha de Alckmin não passaria de retórica eleitoral, de uma tentativa desesperada de encontrar algum discurso que ajudasse a conter a queda de Alckmin nas pesquisas. Terminou prevalecendo, porém, a visão mais extremada: a oposição teria decidido jogar a carta da “República do Galeão”, numa referência às investigações paralelas sobre a morte do major Rubem Vaz, conduzidas pela Aeronáutica, em 1954, que terminariam desembocando no suicídio de Getúlio Vargas. Ou seja, ela estaria flertando com o insondável e preparando o caminho para tentar derrubar nas Justiça a vitória de Lula nas urnas. Daí o tom duríssimo da entrevista do coordenador da campanha de Lula, Marco Aurélio Garcia, e dos governadores eleitos da Bahia, Jaques Wagner, e Sergipe, Marcelo Deda. À entrevista, seguiram-se dois movimentos. O primeiro foi o de convocar os presidentes de todos os partidos que apóiam Lula para que eles mobilizem seus militantes e os movimentos sociais. “Não vamos ficar parados se a oposição radicalizar. Vamos para as ruas. Vamos combater o fogo com fogo”, resumiu um importante dirigente da campanha à reeleição. O segundo movimento foi o de conversar reservadamente com os setores moderados da oposição, em especial com os governadores Aécio Neves e José Serra. A expectativa é de que ambos, nem um pouco interessados no agravamento da situação, joguem água na fervura e desarmem seus companheiros mais exaltados. O mais interessante é que, enquanto Brasília pegava fogo no começo da noite de ontem, em todo o país os eleitores assistiam na TV a uma campanha eleitoral civilizada. Na telinha, os dois candidatos discutiram propostas, apresentaram idéias, prometeram o céu e a terra aos eleitores. Houve uma época em que se dizia que o Brasil era a Belíndia – uma parte rica, a Bélgica, convivendo com um país miserável, a Índia. Vendo a televisão ontem à noite, com os bastidores pegando fogo, tive a sensação de que agora somos o Suiraque. Na TV, uma tranqüila Suíça; no mundo político, um incontrolável Iraque. Cautela e caldo de galinha, ainda mais em momentos como esse, não fazem a mal ninguém.

A Bolsa-Família, quem diria, é a musa destas eleições


16.10.2006



Coluna do iG Não são apenas candidatos que saem vitoriosos ou derrotados das eleições. Temas também. Às vezes, alguns deles começam a campanha em alta, com toda a pinta de que vão emplacar, mas terminam em baixa, esquecidos por todos. Outros, porém, surpreendem. Correm por fora, vão se impondo aos poucos e acabam se convertendo em unanimidades eleitorais. Pois bem, ainda não dá para dizer quem será o próximo presidente da República, se Lula ou Alckmin, mas não há mais dúvida sobre quem é a musa desta corrida presidencial: a Bolsa-Família. Até quem não morria de amores por ela no começo da campanha, de uns tempos para cá virou fã de carteirinha da moça. Na semana passada, na entrevista de Geraldo Alckmin à Radio Bandeirantes, perguntei ao candidato se ele não achava ambíguo o discurso de sua campanha sobre a Bolsa-Família. Mais ou menos nos seguintes termos: “Em alguns momentos, diz que é a favor dela e, inclusive, disputa sua paternidade. Em outros, diz que ela é assistencialista, eleitoreira e corrompe quem a recebe. Alguns de seus aliados chegaram a chamá-la de Bolsa-Esmola. O presidente do PSDB, Tasso Jereisssati, por exemplo, em discurso no Senado no dia 29 de agosto, disse que ela implanta uma cultura perversa, porque estimula o “não-trabalho” na população mais pobre. Qual é sua opinião sobre a Bolsa-Família? É uma Bolsa-Esmola ou um bem sucedido programa de transferência de renda?” Alckmin foi muito claro em sua resposta. Disse que, caso fosse eleito presidente, não só manteria a Bolsa-Família como enviaria ao Congresso projeto transformando o benefício em lei, de modo a que, no futuro, ele não pudesse ser concedido ou cancelado ao bel prazer do governo federal. Sua propaganda eleitoral no rádio e na TV no segundo turno não se cansa de afirmar que ele manterá e ampliará o benefício. Pode-se dizer que Alckmin só tomou essa atitude por conveniência eleitoral. Pode-se dizer também que muitos dos seus apoiadores não mudaram de opinião. Continuam achando que a Bolsa Família é apenas uma Bolsa-Esmola disfarçada. E daí? Na política, o importante é que o passo seja dado. Se há entusiasmo ou sinceridade na marcha, é uma questão secundária. O PT, por exemplo, que na campanha de 1994 não dava a menor importância para o combate à inflação, rendeu-se mais tarde à importância da estabilidade da moeda. Mudou de opinião feliz da vida? Claro que não. Mas mudou de opinião – isso é que importa. E essa mudança, ainda que forçada, foi positiva para o país, porque alargou o apoio político à luta contra a inflação. O mesmo vale para a Bolsa-Família. O importante é que o programa de transferência de renda, que começou a campanha eleitoral sob fogo cerrado da oposição, tenha saído da linha de tiro e agora esteja recebendo tratamento VIP por parte de todos os candidatos. Não é pouca coisa. Ao contrário, é uma das conquistas mais relevantes desta campanha. Pessoalmente, considero a Bolsa-Família um importantíssimo programa de transferência de renda. Necessita aperfeiçoamentos? Sem dúvida, especialmente no controle das condicionalidades, na revisão constante dos cadastros e na definição mais precisa das portas de saída. Mas, apesar desses problemas, é um programa bem sucedido. É bom, eficiente e barato. É bom, porque ajuda a diminuir a miséria e a pobreza no Brasil. É eficiente, porque o dinheiro chega às mãos de quem precisa, sendo quase todo gasto em alimentos e gêneros de primeira necessidade. Há menos gente passando fome no país hoje. É barato: 11 milhões de famílias são atendidas a um custo anual de R$ 8 bilhões 400 milhões, menos do que a União gasta por ano no serviço da dívida por cada 1% da taxa de juros. Por tudo isso, seria uma pena se a Bolsa-Família levasse uma trombada na campanha. Ainda bem que ela passou com louvor na prova de fogo do debate eleitoral.

Ibope e Vox: Lula amplia vantagem sobre Alckmin


13.10.2006



Coluna do iG Duas novas pesquisas divulgadas ontem confirmam que Lula aumentou a vantagem sobre Alckmin no segundo turno. De acordo com o Ibope, a dianteira é de 12 pontos (52% a 40%). Para o Vox Populi, é de 10 pontos (51% a 41%). No Datafolha de quarta-feira, vale lembrar, a diferença foi de 11 pontos (51% a 40%). Ou seja, os números são quase iguais, com variações mínimas, na margem de erro. Se as eleições fossem hoje, Lula seria reeleito com folga. Mas as eleições não são hoje. Ainda faltam 16 dias para o segundo turno. Há duas explicações possíveis para o fato de o presidente ter experimentado uma recuperação tão rápida e tão forte num período tão curto – no universo dos votos válidos, sua vantagem sobre o candidato tucano teria passado de 7% nas urnas, no dia 1o de outubro, para 14% no Ibope de ontem. A primeira hipótese é de que a onda anti-Lula, impulsionada pelo caso do dossiê e potencializada pela ausência de Lula no debate da Globo, teria se esgotado no momento em que as eleições foram para o segundo turno. Primeiro, porque o escândalo do dossiê cedeu, saindo do centro do noticiário. Segundo, porque para muitos eleitores o segundo turno já seria uma punição suficiente para a arrogância do presidente na reta final. A segunda interpretação é de que o debate da Band foi o fator decisivo para o alargamento da vantagem de Lula sobre Alckmin. O comportamento agressivo do candidato do PSDB no confronto, embora tenha feito furor no núcleo duro do seu eleitorado cativo, teria chocado entado os eleitores menos firmes ou indecisos, que estariam retornando para Lula. Minha avaliação é de que as duas interpretações complementam-se. Na verdade, referem-se ao mesmo fenômeno: a volatilidade de um segmento relativamente pequeno do eleitorado, que não ultrapassa 10% do total dos votantes, composto principalmente por pessoas com renda de 5 a 10 salários mínimos, mais forte nas regiões Sul e Sudeste. Esse segmento, pouco ideológico mas moderadamente progressista, não é nem Lula, nem Alckmin, e vê pontos positivos e negativos nos dois candidatos. Ao longo de toda a campanha, esses eleitores oscilaram muito, mas, no começo de setembro, motivados pela propaganda na TV, deram sinais de que estavam aportando em Lula. Esse movimento, porém, foi abortado pelo escândalo do dossiê e transformado em seu oposto pela ausência do presidente do debate da Globo. A reviravolta foi decisiva para empurrar a eleição para o segundo turno. Anunciados os resultados, Lula passou a acertar mais do que Alckmin. Antes de mais nada, recebeu com humildade o puxão de orelhas dado pelas urnas e reconheceu que havia errado ao não comparecer ao debate. Ou seja, desceu do pedestal e restabeleceu as pontes com os eleitores que quiseram puni-lo. Enquanto isso, Alckmin passou a errar mais do que Lula. Suas trapalhadas na montagem dos palanques estaduais deram a tônica do noticiário, com destaque para a foto com o casal Garotinho e para a desastrada visita a ACM na Bahia. Resultado: Lula voltou a ganhar terreno entre os eleitores indecisos. Mas, no plano simbólico, o estilo Mike Tyson adotado por Alckmin no debate da Band foi crucial. O candidato tucano cometeu o grave erro de falar apenas para quem já estava com ele e não lidou corretamente com as dúvidas e incertezas do segmento volátil do eleitorado. Não entendeu que esse pessoal havia forçado a realização do segundo turno porque queria mais tempo para amadurecer o voto, mas não havia aderido ao sentimento raivosamente anti-Lula do núcleo duro do eleitorado de Alckmin. Resultado: o candidato tucano passou do ponto e ficou mal na fotografia. Na pesquisa do Vox Populi, 38% dos entrevistados disseram que Alckmin foi agressivo no debate da Band, contra 14% que atribuíram essa marca negativa a Lula. Já no quesito simpatia, o vencedor foi o presidente. Alckmin já percebeu que derrapou na largada do segundo turno, tanto que moderou o tom do seu discurso na retomada da propaganda eleitoral na TV. O problema é que perdeu duas semanas preciosas e, de quebra, ainda não encontrou o ponto adequado para sua campanha. Se bater demais, não conquista o eleitor indeciso. Se bater de menos, talvez não consiga descontar a vantagem de Lula. Não é uma decisão fácil. Mas como ainda faltam 16 dias para as eleições e, no PT, aloprado é o que não falta, tudo pode acontecer.

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