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Algumas reflexões sobre as eleições da Câmara e do Senado


02.02.2007



Coluna do iG Apesar das paixões, dos discursos e da efervescência, deu a lógica nas eleições para as presidências do Senado e da Câmara. As vitórias de Renan Calheiros e Arlindo Chinaglia representaram uma volta ao princípio da proporcionalidade: cada partido tem no comando do Legislativo um peso compatível com a fatia do eleitorado que conquistou nas urnas. Nos últimos anos, esse princípio havia sido deixado de lado, não só em Brasília como em muitas assembléias legislativas, com os resultados que todos conhecemos, o que despertou na maioria dos partidos – pelo menos, nos grandes partidos – um forte anseio pelo retorno á normalidade. Foi esse sentimento que prevaleceu ontem. Algumas outras conclusões podem ser tiradas das disputas na Câmara e no Senado: 1) Por incrível que pareça, pessoalmente, os três candidatos a Presidência da Câmara saíram no lucro.Gustavo Fruet, do PSDB, obteve uma votação maior do que se esperava. Saiu da disputa bem maior do que entrou, tornando-se um dos principais nomes do seu partido. Aldo Rebelo levou o confronto para o segundo turno e perdeu por uma diferença relativamente pequena. Embora derrotado, não foi humilhado. Ainda que pertencendo a um pequeno partido, com apenas 13 deputados, firmou-se como uma das principais lideranças do parlamento. Não é pouca coisa. Já Chinaglia elegeu-se presidente da Câmara. Não era o candidato de Lula, mas tornou-se o candidato da maioria da base governista. Apesar do susto, foi o grande vitorioso de ontem. 2) Durante a disputa, o PT e o PMDB uniram-se para atingir seus objetivos. O do PT era sair do isolamento político, não permitindo que o confinassem ao gueto em que se meteu e foi metido durante o escândalo do mensalão. Já o PMDB pretendia ganhar um mínimo de unidade interna, voltar para o centro do jogo político e entrar na coalizão governista como uma estrela de primeira grandeza. Os dois partidos alcançaram seus objetivos. Mais do que isso: descobriram que, pelo menos durante um bom tempo, têm mais a ganhar caminhando juntos do que separados. A meta de ambos agora é ser o eixo político do governo. 3) O PSB, o PCdoB e o PDT também firmaram uma aliança nesse processo, para não ser engolidos pela ação coordenada dos dois maiores partidos da coalizão, o PT e o PMDB. Tendem a se constituir como um pólo de esquerda não-petista. Sua força não deve ser desprezada. Reúnem mais de 70 deputados, oito senadores, cinco governadores e exercem uma razoável influência na sociedade. E têm um nome visível para 2010: Ciro Gomes. Saíram da sombra e querem seu lugar ao sol. 4) As eleições de Renan e Chinaglia foram, simultaneamente, boas e ruins para Lula. Boas, porque ele terá aliados no comando das duas casas e ficou claro que o poder de fogo da oposição, no momento, é pequeno. Ruins, porque a base do governo dividiu-se na disputa pela presidência. Não se trata de uma divisão irremediável, mas tampouco é algo que se cure com um pouco de mercúrio cromo, como disse ontem o presidente. Há braços na tipóia, pernas engessadas, nervos à flor da pele e, mais grave, corações partidos. As seqüelas não se limitam a um outro arranhão. Seu tratamento exigirá um salto de qualidade na articulação política do governo. 5) A eleição de Chinaglia, longe de obrigar Lula a ceder mais espaço para o PT no ministério, como avaliam alguns analistas, dará ao presidente mais liberdade para estabelecer um novo equilíbrio político no governo. O PMDB terá provavelmente quatro ministérios. O bloco formado pelo PSB, PCdoB e PDT, também. Já o PT perderá posições, mas seguirá sendo o partido com maior presença no primeiro escalão, até porque vários ministros petistas (Dilma Roussef, Luis Dulci, Tarso Genro, Guido Mantega e Paulo Bernardo) são hoje da cota do presidente e não da legenda. 6) A oposição também saiu bem machucada das disputas. No Senado, o PFL e o PSDB, juntos, tinham 30 votos. Somando-se esse total aos quatro senadores da base governista que haviam anunciado publicamente que apoiariam José Agripino Maia, o candidato da oposição deveria ter recebido, pelo menos, 34 votos. Obteve 28. Ou seja, houve, no mínimo, 6 defecções entre os senadores oposicionistas – o coeficiente de traição, de 20%, foi altíssimo. O veneno e o fel destilados ontem entre os senadores da oposição daria para intoxicar meia Brasília. Na Câmara, o PSDB, como era de se esperar, dividiu-se no segundo turno. Metade da bancada, mais ligada aos governadores José Serra e Aécio Neves, votou em Chinaglia, em nome do princípio da proporcionalidade. A outra metade, que reverbera o estado de espírito do núcleo duro do eleitorado de Geraldo Alckmin, apoiou Aldo Rebelo. É uma divisão que ainda vai dar pano para as mangas.

Nem céu de brigadeiro, nem divisão irremediável


01.02.2007



Coluna do iG A guerra de blocos que tomou conta da Câmara ontem comporta duas leituras. A primeira é de que o governo terá um futuro risonho e tranqüilo na Câmara nos próximos anos.Afinal, somando-se o blocão, capitaneado pelo PT e pelo PMDB, com o bloquinho, que agrupa o PSB, o PCdoB e o PDT, ambos compostos por partidos governistas, o total é de 343 deputados, maioria suficiente para aprovar com folga até emendas constitucionais. A segunda leitura é de que o surgimento dos dois blocos consolidou de modo irremediável a divisão da base governista, já esboçada com o confronto entre as candidaturas de Arlindo Chinaglia e de Aldo Rebelo. Daqui para frente esse processo só tenderia se agravar. No fundo, já estaríamos vivendo sob o signo de 2010. Ciro Gomes? Marta Suplicy, Dilma Roussef ou Jaques Wagner? Façam suas apostas ... As duas leituras, embora captem aspectos importantes da realidade, são limitadas. Nem a situação do governo no Congresso é tão tranqüila como os números parecem indicar, nem a divisão dentro da coalizão atingiu uma dimensão tão dramática como os ânimos exaltados na Câmara podem sugerir. O que os fatos demonstram é que Lula está dando a largada para o segundo mandato com um quadro parlamentar bastante favorável, em parte devido ao seu expressivo desempenho nas urnas, em parte devido à falta de rumo da oposição, mas esse cenário pode se deteriorar se não houver um salto na articulação política do governo. A entrada do PMDB na base governista significou um extraordinário reforço para Lula. Mas, ao mesmo tempo, ela cria problemas, pois se trata de um partido muito grande, espaçoso e profissional. Dividido e remando contra a corrente, como no primeiro mandato do presidente, o PMDB não assustava ninguém. Mas, jogando a favor do vento e com um grau de mínimo de unidade, pode ser uma jamanta política. Ao apoiar Chinaglia, por exemplo, deixou claro que estava voltando para o centro do jogo político, e não para sua periferia. Entre embarcar na canoa de Aldo Rebelo, na qual o PFL já ocupava a posição de aliado preferencial, ou tornar-se o grande eleitor de Chinaglia, o PMDB não pensou duas vezes. Sem pestanejar, optou pelo papel de fazedor de reis. Ontem, diante da formação do bloquinho, reagiu de forma fulminante com o blocão. Deu o recado de que a Câmara voltou a ter um centro de gravidade político, capaz de produzir com rapidez e contundência os movimentos necessários para preservar seu poder. Se Chinaglia for eleito presidente da Câmara hoje, como parece provável, o PMDB, menos de quatro meses depois das eleições em que se apresentou dividido, terá consolidado a posição de principal partido no Legislativo, não apenas pelo tamanho de suas bancadas, mas por sua influência política. Não é pouca coisa. É evidente que isso mexe profundamente com a frágil e instável aliança que sustentou Lula no primeiro mandato. Gera inseguranças. Acende ressentimentos. Provoca reações. Mas, principalmente, torna muito mais complexo o jogo político no interior da coalizão. O fato é que a mesa de pôquer do Palácio do Planalto não é mais a mesma. Há, pelo menos, três grandes parceiros com jogo forte na mão: o PT, o PMDB e o bloco do PSB, PCdoB e PDT. São três parceiros capazes de assegurar maioria ao governo no parlamento, mas são três parceiros capazes também de produzir brigas monumentais no salão. Lula terá muito trabalho pela frente.

Bloco pode levar governo a se apoiar num tripé


31.01.2007



Coluna do iG A bancada do PDT decidiu apoiar Aldo Rebelo para a presidência da Câmara e formar um bloco com o PSB, o PCdoB e o PV, que talvez venha a atrair outros pequenos partidos. O apoio do PDT, a dois dias das eleições, fortalece a candidatura de Aldo, mas Arlindo Chinaglia continue sendo o favorito. Amanhã saberemos quem levou a melhor. Já não era sem tempo. Ninguém agüenta mais esse nhenhenhém. Já o endosso do PDT à idéia do novo bloco tem um alcance político mais duradouro. PSB, PCdoB, PDT e PV, juntos, ultrapassam 70 deputados, ficando logo atrás do PMDB, que elegeu 89, e do PT, com 83. Se outros pequenos partidos somarem-se a esse movimento, a bancada do bloco engordará ainda mais. Ainda não estão claras as intenções dos partidos que estão impulsionando a iniciativa. Podem estar mirando no varejo. A agrupação de forças seria apenas (ou principalmente) um expediente para conquistar melhores posições na mesa da Câmara e ter mais influência no dia-a-dia da casa. Se for assim, é coisa miúda. Mas há indícios de que os partidos estão mirando no atacado. A formação do bloco seria uma resposta à aliança entre o PT e o PMDB, que lançou a candidatura de Chinaglia, e à possibilidade de que ela, consolidando-se, viesse a agir como um rolo compressor dentro do segundo governo Lula. Divididos, os partidos médios com perfil de esquerda seriam postos à margem do jogo político da coalizão governista pela ação conjunta das duas legendas maiores. Unidos, eles passariam a ser um fato de poder que não poderia ser desprezado, tendo voz ativa nas decisões de fundo. Isso é bom ou ruim para Lula? Talvez seja bom. Primeiro, porque contribui para garantir uma expressão adequada de importantes parcelas da base política, eleitoral e social do governo. Impede sua asfixia. Segundo, porque ajuda a organizar o jogo político no seu interior. Em vez de lidar isoladamente com 11 partidos, o presidente poderia negociar preferencialmente com três grandes formações: o PMDB, o PT e o bloco. É claro que ele teria também de levar em conta os partidos médios remanescentes – o PP e o PR (ex-PL) –, mas já num segundo degrau de uma escala de prioridades. Quanto ao PTB, que se encontra em aguda disputa interna, o mais provável é que se torne irrelevante. Deve perder um grande número de deputados, especialmente para o PSB. Tudo somado, nessas condições, a coalizão governista tenderia a se assentar basicamente sobre um tripé, e não sobre um eixo. Resultado: o jogo político no seu interior se tornaria mais complexo, o que aumentaria a margem de manobra de quem está no centro dos acontecimentos: o presidente. Desde que, é claro, ele não perca a iniciativa e saiba usá-la a seu favor. Em contrapartida, a direção e a estabilidade da ação do governo exigiriam muito mais sofisticação da articulação política do Palácio do Planalto do que ela teve até agora. Trata-se de um desafio e tanto.

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