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26.Samba do partido doido

Franklin Martins

15/05/1955


Samba do partido doido


A decisão das autorida-des desportivas de in-cluir a dança de salão entre os esportes olímpi-cos deixou eufóricos os australianos. Como na terra dos cangurus a dança com passos en-saiados é uma mania na-cional, os aussies estão certos de que vão faturar mais algumas medalhas por conta da novidade. Nossos cartolas pode-riam se mirar no exem-plo de seus colegas aus-tralianos e mexer os pau-zinhos para que o COT reconhecesse como es-porte olímpico outra mo-dalidade de dança: a dan-ça das cadeiras. Se fos-sem bem sucedidos nessa empreitada, dificilmente o Brasil deixaria de su-bir ao pódio ao final da competição, podendo, in-clusive, fazer barba, ca-belo e bigode. Sem falsa modéstia, temos os me-lhores atletas do mundo nesse género de ativida-de. Refiro-me ao grupo que vem treinando com afinco no Plenário Ulys-ses Guimarães. Em nenhum Parlamen-to do planeta há tantos deputadas capazes de trocar de cadeira com tanta rapidez como no nosso. Somos simples-mente imbatíveis. Vejam só o exemplo da atual le-gislatura da Câmara, ins-talada em fevereiro. Em cerca de cem dias, nada menos de 26 deputados já mudaram de partido. Se esse ritmo alucinante for mantido, 415 dos 513 in-tegrantes da Câmara, ao disputarem a reeleição em 1998, estarão fora dos partidos peloa quais fo-ram eleitos. E o samba do partido doido. Há partidos demais. Só na Camara, 18 deles es-tão representados. Outro tanto, fora do Parlamen-to, possui registro e pode lançar candidatos. Espe-rava-se que a prolifera-ção dos partidos que se seguiu ao fim da ditadu-ra fosse doença passagei-ra, a ser curada pelas freqüentes consultas às urnas. Argumentava-se que o eleitor, com seu bom senso, através do voto, reduziria progressi-vamente o leque de op-ções. A realidade, no susten-to, não confirmou essas previsões. Partidos conti-nuam surgindo como co-gumelos. E por unia ra-zão muito simples: a lei não pune, mas recom-pensa quem faz o tráfico de legendas de aluguel. Quinhentos mil reais é quanto custa formar o número de comissões provisórias exigidas por lei para que o Tribunal Superior Eleitoral-conce-da o registro definitivo a um partido, conforme re-velou, há duas semanas, advogado paulista espe-cializado na matéria — responsável ele próprio, por encomenda de seus clientes, pela vinda ao mundo de uma meia dú-zia desses monstrengos. Com o registro, con-quista-se o direito a uma hora em rede nacional de rádio e televisão para di-fusão do programa parti-

eleitoral gFatuita nos 60 dias anteriores aos plei-tos e a possibilidade de lançar candidatos e de fechar coligações eleito-rais. Trata-se de uma mi-na cie ouro na mão de quem aprendeu com o garoto-propaganda dos cigarros Vila Rica que o Importante na vida é le-var vantagem. Para tentar pôr freio a essa situação, a comissão especial da Câmara en-carregada de estudar re-formas nas leis eleitoral e partidária está propen-da uma série de mudan-ças. Duas delas, se adota-das, teriam impacto ful-minante: a proibição de coligações nas eleições proporcionais e a exigên-cia de que o partido te-nha, no mínimo, 5% dos votos em escala nacional para estar representado na Câmara. Projeções feitas por técnicos em le-islação eleitoral, ouvi-os pelas repórteres Mô-nica Gughano e Lydia Medeiros, do GLOBO, in-dicam que, se as coliga-ções tivessem sido proi-bidas nas eleições pro-porcionais de 1994, o nú-mero de partidos com as-sento na Câmara seria de 12 (e não de 18). Se instituída a barreira dos 5% dos votos nacionais, esse número desceria pa-ra oito. As legendas de aluguel seriam vaporiza-das. A discussão dessas duas alterações vai dar panos para mangas. O ideal seria encontrar um ponto de equilíbrio entre a simplificação do qua-dro partidário, necessá-ria para dar conseqüên-cia ao voto do eleitor, operacionalidade ao Par-lamento e condições de governabilidade ao Exe-cutivo, e a existência de mecanismos que permi-tam sua constante oxige-nação e eventual reorde-nação. Há um fio condu-tor para se chegar a esse ponto: o respeito ao voto do eleitor. As coligações propor-cionais geralmente se constituem numa burla ao sufrágio depositado na urna. Legendas sem expressão eleitoral mon-tam na garupa de outras, que lhos dão carona p-or que estão interessadas em apoio para eleições majoritárias ou em au-mentar seu tempo na te-levisão. O eleitor vota num partido, mas acaba mandando para Brasilia candidatos de outro. Não há por que manter esse tipo de prática. Diferente é a exigência do mínimo de 5% dos vo-tos nacionais. Num pais das proporções do Brasil e com diferenças regio-nais marcantes, dificil-mente os partidos ga-nham densidade eleitoral de uma só vez em todo o país, ou simultaneamen-te nos centros urbanos e nas zonas rurais. Nas eleições de 1962 — há 13 anos, portanto — o PT não atingiu 5% do eleito-rado nacional. Roje é o partido Mis importante da oposição, A história seria a mesma se e seu


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