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02.O PT entre o teto e a esfinge

O PT entre o teto e a esfinge


28.11.1999



O Congresso do PT, que termina hoje em Belo Horizonte, tem enorme importância não só para os destinos do partido como para o próprio desenrolar da luta política nos próximos anos. O PT, hoje, é um partido fortíssimo. Como demonstraram as últimas eleições nacionais, um em cada três brasileiros vota no Partido dos Trabalhadores ou no bloco político dirigido por ele. No entanto, como também demonstraram as últimas eleições nacionais, o PT , embora fortíssimo, está emparedado. Não consegue romper o teto dos trinta e pouco por cento do eleitorado. Nem o espetacular desgaste do governo Fernando Henrique parece ter sido capaz de alterar tal situação. Até agora, os maiores beneficiários do desencanto com FH têm sido Ciro Gomes e Itamar Franco. O eleitor de centro (mas com simpatias pela esquerda) permanece avesso a embarcar na canoa de Lula e de seu partido. Segue vendo-os com reservas e desconfianças. Como vencer esse problema? Como romper a barreira dos 30% sem se descaracterizar? Como estender a influência do PT até setores mais moderados da sociedade, mantendo vivos e intactos os vínculos com a parcela mais radicalizada da população? Não há respostas fáceis para essas perguntas, mas isso não pode servir de desculpa para o PT contorná-las. Há algum tempo que a falta de uma definição clara diante desses dilemas está paralisando a ação do partido. "Decifra-me ou devoro-te", parece dizer a esfinge política empacada na frente do PT. Não é a primeira vez que tal dilema bate às portas de partidos de esquerda fortes. O Partido Comunista Italiano, por exemplo, nas décadas de 60 e 70, deu-se conta de que tinha atingido seu teto. Chegou a alcançar 35% do eleitorado, mas, a partir daí, não lograva crescer. O que fazer? Persistir na política tradicional, tentando se fazer palatável ao eleitorado do centro que, a cada dia, se desencantava mais com a democracia cristã e com os demais partidos? Ou lançar uma nova política, buscando atrair para a centro-esquerda a democracia cristã (ou parte dela)? O PCI escolheu a segunda alternativa, que batizou de "compromisso histórico". Ainda que não tenha sido bem sucedido, pois a deterioração da DC já ia longe, o PCI, graças a essa política, acabou abrindo um terreno de entendimento com amplos setores do centro. Quando a partidocracia italiana veio abaixo, na esteira da Operação Mãos Limpas, que revelou a promiscuidade entre a direita daquele país e o crime organizado, o Partido Democrático de Esquerda, que sucedeu ao PCI, estava pronto para formar um novo bloco histórico sob sua liderança. O atual primeiro-ministro da Itália, Massimo D'Alema, registre-se, é um pós-comunista. Registre-se também que antes de D'Alema assumir o cargo, os pós-comunistas ajudaram a eleger um dissidente democrata cristão (de esquerda) para a chefia do governo. Terá o PT condições de fazer um movimento semelhante? Até o momento, não há indícios nesse sentido. Em termos de aliança, os petistas têm se limitado a estender as mãos para outras forças de esquerda, que agregam pouco ou quase nada à força eleitoral do partido. O PDT, o PC do B e o PSB, além de pouco expressivos, não têm qualquer penetração junto ao centro. Dessa forma, não são capazes de lançar pontes para a atração desse segmento decisivo da sociedade (ou de parte dele). Não são capazes, portanto, de alavancar uma aliança que agregue mais 15 ou 20% do eleitorado aos trinta e poucos por cento que já votam no partido de Lula, permitindo a formação de uma nova maioria política no país. Como o PT (sozinho ou com seus parceiros tradicionais) não tem condições de atrair uma parcela substancial do centro, terá de buscar inevitavelmente entendimentos com forças políticas que o representam _ parte do PMDB, Ciro Gomes, Itamar Franco etc. Sem se aproximar delas, não conseguirá se aproximar dos segmentos da sociedade que nelas se referenciam. Continuará emparedado. Pode-se dizer - e com razão - que tanto a ala oposicionista do PMDB como Ciro Gomes vêm esnobando o PT. Em princípio, querem passar ao largo de qualquer ação conjunta com a esquerda. Gostariam de chegar ao poder sem compromissos com ela. No entanto, esses setores também não se sentem confortáveis ao lado das forças políticas agrupadas em torno de FH. Dependendo das circunstâncias, poderão marchar para uma aliança com a esquerda, desde que, é claro, sintam que vão ser tratados como aliados, e não como caudatários, e não se vejam obrigados a comer o prato feito das esquerdas, mas chamados a elaborar e aplicar um programa comum. Mas, para isso, será preciso que o PT, como principal partido da oposição, dê um passo à frente, deixando claro que está apostando todas as suas fichas na formação de um bloco que reuna a esquerda e o centro (ou parte dele). As resistências e desconfianças recíprocas continuarão por um bom tempo, sem dúvida. Mas continuarão por muito mais tempo se esse passo não for dado o quanto antes. No fundo, no fundo, o PT tem de decidir se vai ficar na oposição liderando quem pensa como ele, ou lutar para chegar ao governo dirigindo também quem pensa diferente dele. Jornal de Brasília, 28/11/1999

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