O balé da política e a bola dividida da eleição
25.08.2006
Coluna do IG Ao discursar ontem pela manhã, na reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social, diante de uma platéia formada basicamente por empresários e sindicalistas, Lula fez um apelo a todas as forças políticas para que, passadas as eleições, busquem algum tipo de entendimento. "Temos que reduzir a tensão política. Temos que dedicar o nosso tempo mais ao que nos une do que ao que nos divide”, disse o presidente. Ao discursar ontem à noite na cidade de Passos, no interior de Minas Gerais, Geraldo Alckmin deu uma resposta dura às palavras de Lula: “Isso é historinha de véspera de eleição. O presidente teve quatro anos para fazer pactos e fez o pacto dos mensaleiros. Eu vou fazer um pacto com o povo brasileiro para moralizar a política, varrer a corrupção, fazer o Brasil crescer e implementar as reformas que precisam ser feitas”. Aparentemente, Lula deu um tiro na água e Alckmin respondeu com dez pedras na mão. Um falou grego, o outro respondeu em chinês. E cada um foi para um lado diferente. Mas, sob as aparências, algo de importante começou a ser ensaiado ontem no balé da política. É bom ficar de olho. Embora possa ter motivações eleitorais – afinal, tudo tem motivação eleitoral em época de campanha –, a proposta de distensão política de Lula mira basicamente no “day after”. É um apelo para que, abertas as urnas, vencedores e vencidos baixem o tom dos seus ataques e busquem algum tipo de entendimento para desintoxicar o país do envenenamento que marcou a disputa política nos últimos dois anos. Evidentemente, o apelo de Lula não é desinteressado. Com larga vantagem nas pesquisas, o presidente supõe que será reeleito e deseja com razão diminuir a taxa de turbulência de um eventual segundo mandato, Para isso, precisa fazer o que não fez no primeiro: alargar sua base política e conversar formalmente com a oposição. Daí, a iniciativa de ontem. Ela se propõe a mexer no tabuleiro político de amanhã, e não na disputa eleitoral de hoje. Por isso mesmo, é compreensível que ela parta do candidato que reúne mais chances de vitória. A resposta de Alckmin também é compreensível. Com mais de vinte pontos atrás de Lula, o candidato tucano não poderia reagir senão como reagiu: endurecendo o tom do seu discurso. Se piscasse diante do apelo à concórdia vindo do Palácio do Planalto, na prática estaria se colocando como refém de uma lógica pós-eleitoral que apenas o desarmaria e o enfraqueceria num momento em que sua campanha passa por grandes dificuldades. Lula, liderando com folga as pesquisas, pode se dar ao luxo de pensar no futuro. Alckmin, comendo poeira na corrida presidencial, tem de cuidar do presente. Lula pode falar em entendimento. Alckmin tem de apostar todas suas fichas na disputa. Ou seja, nem o gesto do presidente foi inútil, nem a reação do tucano foi descabida. Apenas obedeceram a lógicas diferentes e trabalharam com momentos distintos. É aquela história: cada um sabe onde o calo lhe aperta. Mas, em algum momento, seja no primeiro, seja no segundo turno, a campanha acabará e as urnas serão abertas. E aí a conversa será outra. Se houver bom senso, é claro.
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