top of page

Alckmin: uma frase infeliz, mas nem tanto

Alckmin: uma frase infeliz, mas nem tanto


19.10.2006



Coluna do iG O candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, disse ontem que, se Lula for reeleito, “acaba antes de começar”. E arrematou: “Já começa a discutir 2010 no dia seguinte”. As declarações foram interpretadas pelo ministro Tarso Genro como um sinal de que o candidato do PSDB estaria flertando com o imponderável. Peço licença para discordar de um e de outro. A frase de Alckmin é infeliz, porque, isolada do contexto em que foi dita, presta-se à interpretação de que o candidato tucano estaria coqueteando com a tese do “terceiro turno”, defendida pela ala do PSDB e do PFL que tem a faca nos dentes. No entanto, interpretada à luz do conjunto das declarações de Alckmin na OAB, não há na frase um incentivo ao golpismo. Apenas uma avaliação de que Lula, num eventual segundo mandato, administrará um governo fraco, sem alma e sem rumo, incapaz de liderar o país. Essa opinião não é apenas de Alckmin. Vem sendo defendida por muitos articulistas, que, ao longo da recente crise política, já fizeram vários vaticínios catastróficos sobre seu desfecho, abandonados mais tarde porque os fatos, teimosamente, não quiseram confirma-los. Houve quem dissesse que Lula não terminaria o primeiro mandato. Terminou. Que, desmoralizado pelo turbilhão de denúncias, não seria sequer candidato à reeleição. Foi. Que, sendo candidato, seria escorraçado pelo voto popular. Não é isso que mostram as pesquisas. Que, se fosse eleito, enfrentaria um Congresso dominado pela oposição, pois o PT e os partidos governistas seriam varridos do mapa. Não é esse o desenho do parlamento feito pelas urnas. Agora, esses articulistas prevêem, no caso da reeleição de Lula, um governo à deriva. No mínimo, um interregno inútil até as eleições de 2010; no máximo, um tumulto desgastante com data de validade por quatro anos. O país estaria contratando – sabe-se lá por que, gostam de usar a palavra “contratando” em vez de “elegendo” – uma crise institucional perfeitamente evitável. Minha visão é outra. Se Lula for reeleito, não estará recebendo um cheque em branco. Terá de negociar mais com todas as forças políticas e, principalmente, conversar mais com a sociedade. Esse foi o recado do eleitorado quando mandou as eleições para o segundo turno. Por outro lado, a oposição terá de virar o disco, baixar a bola e parar de apostar todas as suas fichas no agravamento permanente da crise. O pessoal com a faca nos dentes – Bornhausen, ACM, Tasso, Arthur Virgílio, Roberto Freire – sairá enfraquecido da disputa eleitoral. E justamente porque existe 2010 no horizonte, o jogo político passará a ser outro. De um lado, o bloco governista não possuirá um herdeiro natural do espólio de Lula, que poderá ser maior ou menor de acordo com o desempenho da economia nos próximos anos. Ciro Gomes, Jaques Wagner, Tarso Genro, Dilma Roussef, Marta Suplicy, entre outros, podem vir a se criar como candidatos, mas nenhum deles se impõe naturalmente sobre os demais. De outro lado, os dois grandes fatores de poder na oposição – os governadores de São Paulo, José Serra, e o de Minas Gerais, Aécio Neves – não estarão interessados em acirrar indefinidamente a crise política e transforma-la numa confrontação institucional. Ao contrário, tendem a jogar água na fervura e a trabalhar para distensionar o ambiente político. Como contam em vencer as eleições daqui a quatro anos, não querem receber um país em frangalhos. Além disso, como Lula não será candidato em 2010, mas provavelmente um grande eleitor, nem Serra, nem Aécio terá interesse em infernizar a vida do presidente. O mais provável é que busquem estender pontes na sua direção. Tudo somado, o Brasil sairá das urnas melhor do que entrou. Eleições presidenciais não se limitam a apontar vencedores e vencidos. Produzem situações políticas novas. Seria um erro analisar o futuro pela régua do passado, especialmente quando ela já vem mostrando há algum tempo que não consegue medir adequadamente as distâncias entre fatos e desejos.

Posts recentes

Ver tudo

02.Caros leitores

Caros leitores 27.03.2007 Nos últimos oito meses, cinco vezes por semana, dividi com os leitores do IG minhas análises e avaliações sobre...

Comentários


bottom of page