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4.Bate-papo no sindicato dos jornalistas de Rio Grande do Sul

Bate-papo no sindicato dos jornalistas de Rio Grande do Sul


06.06.2006



Depois da palestra de encerramento do 32º Congresso Estadual dos Jornalistas, Franklin Martins ficou por mais de uma hora respondendo perguntas do público – mais de 200 participantes, na maioria estudantes. Além de política, ele falou de sua saída da Rede Globo, projetou seu trabalho na Band e comentou as desavenças com Diogo Mainardi, a quem está processando. Avaliou, ainda, a cobertura da crise política. Leia os principais momentos do diálogo com a platéia. Por que você saiu da Globo? Gostaria de saber... Trabalhei 8 anos e meio na Globo. Tive grandes desafios profissionais lá: fui o primeiro comentarista político do Jornal Nacional, talvez o último, tive liberdade, fiz um programa no GloboNews que se tornou o de maior audiência fora os telejornais, dirigi o jornalismo da Globo em Brasília, e participei da equipe que comandou a cobertura das eleições de 2002. Mas a relação começou a ficar desgastante com a crise política. No final de 2005, houve a decisão de cortar do Jornal Nacional o meu comentário, o do Jabor e o Chico Caruso. Depois, ocorreram pequenos episódios que nem vale a pena mencionar. Meu contrato vencia em maio de 2006. Em março eu ainda não havia sido procurado. Falei com a direção, disse que não sabia se valia renovar o contrato, já que a relação não era a mesma. E eles, “não, que é isso, Franklin, está tudo ótimo, vamos continuar”. E sugeriram que eu tirasse férias e na volta discutiríamos valores. Bom, no retorno me ligaram. “Franklin, dá um pulinho aqui no Rio”. Cheguei lá, me falaram de uma pesquisa qualitativa com o nome de todos apresentadores e comentaristas e disseram: “Olha, você não tem uma imagem muito forte com o público, por isso decidimos não renovar o seu contrato”. E eu, “ah, conta outra”. Primeiro eu saí do Jornal Nacional porque minha imagem era muito forte, temiam que a minha opinião fosse confundida com a da Rede Globo. Antes das férias diziam que minha posição era consolidada. O que mudou? O único fato novo foi meu quebra-pau com o Diogo Mainardi. E eles: “Pode ficar tranqüilo que nós não vamos divulgar essa pesquisa para o público, nós não vamos falar nada”. E eu: “Não, digam, pelo amor de Deus”... Mas eu não quero dar pau na Rede Globo, prefiro ficar com as coisas boas, que foram 98% das que aconteceram quando eu estive lá. Agora é olhar para frente e fazer meu trabalho na Band. Acho que lá posso fazer um bom trabalho, é uma emissora com tradição em jornalismo. Assim como a Rede Globo. O jornalista não deveria ter o direito de se despedir dos leitores na sua última coluna? Acho que sim, tem que dizer, senão, depois, o ouvinte fica perguntando o que ouve com esse cara?, ele morreu? No meu último comentário para a rádio CBN, eu falei normalmente, como se nada tivesse acontecido, mas louco de vontade de dizer que estava me despedindo, saindo para um novo desafio profissional. Mas a cultura não é essa, a prática é de não comunicar a saída. Quantas vezes você foi censurado na Rede Globo? Podem não acreditar, mas eu nunca fui censurado na Globo. Claro, eu sei onde piso. Pelo menos, achava que sabia... É diferente falar no Jornal Nacional, no Jornal da Globo e no GloboNews. Eu quero falar para todo mundo, quero que o telespectador me escute. Não posso desrespeitá-lo, deixar que ele se sinta agredido. Tenho que ter uma interlocução. Na TV, o ideal é pouca opinião e muita informação, análise. Pode ter uma opinião para dar um toque. Mas opinião o tempo todo é um porre. E a sua briga com o Diogo Mainardi? É desagradável ter que responder a calúnia [de que o irmão de Franklin Martins teria sido beneficiado por ele, ao ser indicado para um cargo público]. O Diogo Mainardi é um desclassificado... [palmas do público que assistia à palestra]. Agora, o problema não é o Mainardi, é a Veja. Por que a Veja está fazendo isso com a Veja? Eu não entendo. Nunca fiz tráfico de influência. Arranja um senador que diga que eu pedi para contratar meu irmão. Ele tem a vida profissional dele, é um técnico com experiência... Agora, por que o Diogo fala essas coisas? Ele difamou uns 20 ou 30 jornalistas. É vontade de aparecer. “Apareço dando pau nos outros”. Quem não entrou no “esfola-e-mata” nessa cobertura política ficou no contraponto. Não tenho o menor interesse em polemizar com o Diogo Mainardi, tenho mais o que fazer. Estou processando ele. Pedi direito de resposta, já que a Veja não publicou minha carta. Tem ainda uma queixa-crime por calúnia, infâmia e difamação, e uma ação por danos morais. Você diz que a imprensa está a favor de Alckmin, mas a Rede Globo tem uma cobertura favorável ao Lula? Não vejo a Globo apoiando o Lula. O que se faz é a cobertura do presidente da República, que tem que cobrir. É desigual em relação aos outros candidatos, claro. Mas não vejo a Globo apoiando o Lula. A Globo deu tudo o que se falou contra o Lula. Não tenho a menor dúvida de que os acionistas das empresas de mídia preferem o Alckmin. Qual sua avaliação da edição da Globo no debate do Collor com Lula? A edição da matéria não correspondeu ao que foi o debate. O Lula perdeu o debate, mas não de 5x0, foi 3x1. Não foi uma edição correta. Mas também não decidiu a eleição. O que decidiu foi que parte da classe média, na hora H não foi com o Lula. Lembro que voltei a São Paulo com a sensação de que o Lula ia perder. A militância do PT estava muito agressiva. Assustou a classe média aquele negócio de “quem não é Lula não vale nada”. O que achou da cobertura da crise política no governo Lula e das CPIs? Foi uma cobertura difícil, complexa, não foi fácil. Primeiro houve uma desilusão com o PT. Segundo, um grau de desmoralização do PT e do governo que eu nunca vi nesses 20 anos de Congresso. Os deputados do PT ficaram cinco meses sem responder às acusações. Por exemplo, o Toninho da Barcelona disse isso. Aí, os deputados, senadores da oposição deram pau. E os deputados do PT só diziam: “Tem que investigar”. Ficaram cinco meses nas cordas. Terceiro, foi uma CPI muito difícil de transmitir, foi a primeira em tempo real. Tudo se produzia sem a intervenção dos jornalistas. A secretária do Marcos Valério, a Karina, deu o depoimento dela ao vivo. A Renilda, mulher do Marcos Valério também. O Duda Mendonça se apresenta espontaneamente e diz que recebeu dinheiro do exterior porque o PT obrigou. Aí vem cinco deputados do PT chorando um no ombro do outro. O Duda é um marqueteiro, essa é a profissão dele, o que ele sabe é vender o peixe da melhor maneira. E ele trabalhou 15 anos com o Maluf, imagina que nesse tempo todo ele nunca ganhou no exterior. Recebeu sempre, como depois ficou provado. A conclusão é que se fez um espetáculo para o espectador. Jornalista ia atrás do que já tinha sido publicado. É difícil cobrir em tempo real. Cobrir com inteligência, numa situação dessas, não é fácil. Cria-se o clima de linchamento. A pressão enorme, daqui a pouco o editor cobrando, “pô, levou furo”. E os padrões vão cedendo. Começa a publicar qualquer coisa. Até setembro, a imprensa fez um bom papel, revelando o Marcos Valério, a compra de fidelidade partidária. Mas a partir de setembro-outubro, virou, noticiava qualquer coisa. Toninho da Barcelona saiu da prisão falando um monte de coisa. Nada foi provado, mas foi noticiado. Faltou inteligência na cobertura. O clima de “esfola-e-mata”, de linchamento dominou. Como vê a questão da ética na política? Falha ética não é só na política, até na nossa profissão acontece. Desse problema todo ficou uma profunda decepção do país com o PT. Não se esperava isso, ainda que tenha sido feito por uma parte do partido, mas era o grupo da diretoria, que fez mais ou o mesmo que os outros fizeram. Então, primeiro, houve uma profunda decepção com o PT. Segundo, as pessoas que acusam, fizeram a mesma coisa. O povão vê essas coisas: “Houve sim pilantragem, agora esse cara vir falar de ética”... Por que no Brasil não se discute programa político nas eleições? Tem sim programa político, só que não são tratados em especificidades, mas através de símbolos. E olha, em geral o povo no Brasil vota bem na eleição majoritária. O que significou a surra que o FHC deu no Lula? A população deu um recado: “Eu não quero inflação”. Por que o Serra perdeu para Lula, depois dos mandatos do FHC? “Ter moeda é bom, claro, mas eu quero emprego, inclusão social”. FHC e Lula tiveram programa político. Nessa eleição, se o símbolo da disputa for a questão ética, o Lula perde. Se for a questão da moeda e inclusão, dá Lula. E o PT, como fica depois desse escândalo? O PT cometeu sérios erros. Mais que o Caixa 2, comprou fidelidade partidária. Não que isso seja proibido: até pode pagar R$ 10 milhões ao PL para comprar o apoio político, desde que registre isso na Justiça Eleitoral. E não entregando R$ 10 milhões para o Waldemar da Costa Neto (PL). Enfim, o PT fez coisas gravíssimas. Mas também não inovou. Não quer dizer que tenha que aliviar o PT por isso. Mas a cobertura tinha que ser com espírito crítico. Vem o ACM Neto e apresenta um estudo sobre Fundos de Pensão. Quem entende diz que não é sério o estudo. Pode publicar, mas tem que dizer isso. Em setembro e outubro a questão era: De onde veio o dinheiro do Valerioduto? A CPI não foi atrás de pistas importantes. O relatório final não disse de onde veio o dinheiro. E a imprensa se perdeu, tinha que cobrir com mais inteligência e independência. E a tentativa de impeachment do Lula? Se tivesse como se fazer o impeachment, teria acontecido. Só que não tinha a marca de batom na cueca, isto é, a prova definitiva para pegar o Lula. Além disso, se tirasse o Lula, tinha outro problema: entraria o José de Alencar. E faltava o principal, que é clamor popular. Ou seja, o que havia era uma disputa política. Por isso, a oposição mudou de estratégia, e decidiu sangrar o Lula até a morte. Corre o risco de ficar sangrando ele até 2010. Quem será o vice de Lula? O ministro Nelson Jobim, que é o sonho de Lula não vai ser, porque o PMDB não vai fazer aliança com o PT. O Ciro Gomes não acrescenta nada, o Lula já está muito bem no Nordeste. Acho que o vice-presidente vai ser de novo o José de Alencar. Ele traz a contribuição de sua base, em Minas Gerais, e foi leal ao Lula na crise. Já imaginou se o vice fosse o Itamar, o que ele não teria? Como projeta a participação do Psol nessas eleições? A Heloísa Helena deve fazer uma boa votação. O problema é que ela vai ter só 50 segundos de televisão. Se ela passar dos 10% de votos, temos aí um fato político novo, se não, não. Agora, uma coisa é a Heloísa Helena e outra é o PSol. Tem a cláusula de barreira que é mais complicado. Acredito que o PSol vai fazer cinco deputados – um ou dois no Rio de Janeiro, um em São Paulo, um no Rio Grande do Sul... Agora, é muito dífícil atingir o quociente eleitoral. A Luciana Genro vai fazer uma bela votação, mas não vai ser fácil atingir o mínimo. Por isso que o Babá foi para o Rio de Janeiro. Acha que o Rigotto tinha alguma chance se implacasse como candidato a presidente? Não entendo como o Rigotto aceitou aquele jogo. Vai ver ele achou que ia ser bom para ele. Mas se ele tivesse bancado, dito “eu fiz mais votos”, não teriam proclamado o Garotinho. Rigotto não entendeu a malandragem do PMDB em escala nacional. Ali só tem cobra criada. Se o Rigotto tivesse passado a prévia e fosse o candidato do PMDB, poderia dar trabalho. Se ele mantivesse a saúde mental no meio da loucura que é o PMDB, poderia incomodar. O PMDB não tem candidato porque é traído sempre. Os mais vivos não querem ser candidatos por isso. Rigotto achou que amansaria as feras. O que achou das declarações do Cláudio Lembo? É das coisas que surpreendem. Ele estava lá abandonado, amargurado, já chegou num estágio em que não tem mais pretensão de participar de eleições, não é obrigado a seguir o jogo político. E começou a falar verdades, espinafrou todo mundo. O Lembo falou o que pensava e todo mundo concordando, “pô, é isso mesmo”. E assim ele deu uma porrada monumental em Alckmin, que é o homem que arrumou São Paulo. Acontece essa movimentação do PCC, que paralisou a cidade, o povo foi para casa, e o Lembo disse por exemplo, que o Alckmin não ligou porque o pulso telefônico é caro. Afetou a imagem de bom gerente do Alckmin. Qual sua opinião sobre o voto obrigatório? E o voto nulo? Sou a favor do voto obrigatório. Acho o voto nulo uma babaquice. Não existe isso que estão espalhando em listas na internet, de que se 50% + 1 dos votos forem nulos as eleições são anuladas e os candidatos não podem concorrer. São convocadas novas eleições e todo mundo pode ser candidato. Então, isso é no mínimo uma perda de tempo, dinheiro. Acho que as pessoas devem trabalhar pelo melhor candidato ao Legislativo. Sempre tem um sujeito íntegro em quem se possa votar, seja você do PP ou do PT. Na eleição majoritária, sempre tem um menos pior. O voto nulo, em tese, é do sujeito que tem consciência e não quer nenhum dos candidatos. Mas se quem pode votar melhor anula, mais gente ruim vai ser eleita. Em 1970, eu fiz campanha pelo voto nulo e me arrependo. Teve um efeito negativo. No Rio Grande do Sul, por exemplo, onde a Arena podia ser derrotada, não foi, porque prevaleceu a tese do voto nulo. E a imprensa na Venezuela? Não entendo nada de Venezuela, mas a partidarização da imprensa é prejudicial. A revista Veja diz que tem 1 milhão de assinantes. Não acredito que pelo menos 20% desse público não tenha votado no Lula. E muitos desses não devem ter renovado sua assinatura, porque se sentem agredidos pela Veja. Se 10% desse público sair, isso é algo que pode comprometer a estabilidade econômica, porque não é uma coisa monumental a margem de lucro das empresas jornalísticas. No Brasil, não tem como fazer jornalismo político partidário. Tem que ser um público plural, o cara do PP, do PT e o que detesta política, todos devem ser respeitados. A imprensa não pode passar da altura das suas chinelas, que é informar, não puxar para lá ou para cá.

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