Verba indenizatória: que tal um ano de transparência e pente-fino?
26.02.2007
Coluna do iG A reportagem da Folha de S. Paulo de ontem apenas veio confirmar aquilo que até as pedras do Congresso Nacional sabem: a chamada verba indenizatória, atualmente fixada em R$ 15 mil, funciona como um segundo salário enrustido para deputados e senadores, sobre o qual não incidem impostos e descontos. Basta que eles apresentem notas fiscais de despesas com aluguéis, carros, restaurantes, hotéis, combustível, serviços de terceiros etc, para serem imediatamente reembolsados pela Câmara e pelo Senado. Sempre que a imprensa debruçou-se sobre o assunto e examinou os registros dos reembolsos encontrou fortes evidências da existência de artifícios contábeis para justificar o recebimento do dinheiro. Por exemplo: há deputados que gastam rotineiramente a quase totalidade da verba em apenas uma rubrica (combustível, alimentação, aluguel ou serviços de consultoria), sugerindo algum tipo de acerto com o fornecedor. Na reportagem da Folha, voltam a aparecer indícios veementes de que a tal da verba indenizatória, para muitos parlamentares, não passa de uma conta de chegar – uma conta de como chegar todos os meses aos R$ 15 mil reais mensais. O líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves, por exemplo, gastou, em janeiro de 2007, R$ 10.500 com a divulgação de sua atividade parlamentar. Graças aos repórteres Rainier Bragon e Letícia Sander, ficamos sabendo que ela foi feita no jornal “Tribuna do Norte”, de Natal, que pertence à família do deputado e do qual ele é um dos principais acionistas. Como se vê, uma mão lava a outra. Ou melhor, uma mão paga à outra. O deputado Osvaldo Reis (PMDB-TO), como não tem uma empresa de comunicação na família, recorreu a terceiros. Diz que usou a verba indenizatória para pagamento de reportagens e notícias favoráveis em jornais e rádios da sua região. Outros parlamentares deram a entender também que usaram boa parte da verba da grana na compra de favores em órgãos de imprensa. Abro um parêntesis. É difícil saber o que é pior: se o deputado que diz que compra espaço num jornal de sua propriedade, o que é um atentado à inteligência alheia; ou se o parlamentar que suborna empresas de comunicação, o que é um atentado à liberdade de imprensa – a menos que alguém ache que liberdade de imprensa é a liberdade de alguém ganhar dinheiro vendendo gato por lebre ao leitor ou ao ouvinte. Fecho o parêntesis. Seja como for, em ambos os caos, não há razão para que esses expedientes deploráveis sejam bancados pelo contribuinte e para que ele seja tratado como um idiota que engole qualquer marmelada contábil lançada no papel. Já passou da hora de atacar de frente essa excrescência que é a verba indenizatória. Sugiro um programa de três pontos para enfrentar a questão: 1) que os valores da verba indenizatória sejam congelados por um ano; 2) que, a partir de agora, os portais da Câmara e do Senado passem a publicar mensalmente os registros detalhados dos reembolsos, com os nomes das empresas e os números das notas fiscais, e que a imprensa tenha acesso a toda a papelada; 3) que, depois de 12 meses de pente-fino, o Congresso decida se manterá ou não a verba indenizatória. Duvido que mantenha. Duvido que ela resista a um ano de ampla divulgação e intenso escrutínio. PS: Se você quer fazer uma viagem ao mundo da verba indenizatória na Câmara, vá até http://www2.camara.gov.br/transparencia/verbainden.html Trata-se de uma viagem superficial, porque as informações não são detalhadas, mas dá para ter uma idéia geral de paisagem. Já o Senado sente-se no Olimpo. Não divulga qualquer prestação de contas. A caixa-preta é total e absoluta. Queixas com a Mesa do Senado ...
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