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Um Sucatão está na pista


30.12.1999



Carregando no lombo mais de 40 anos de hangar (e pouquíssimas horas de vôo) está taxiando na pista o Sucatão do parlamentarismo. Em outros países, aeronaves desse modelo têm larga aceitação, sendo vistas como exemplos de segurança institucional, flexibilidade política e responsabilidade administrativa. No Brasil, porém, não passam de equipamentos de ocasião, que só dão suas voltinhas quando falta às elites um comandante confiável para o avião presidencialista. Foi assim em 1961, quando o piloto, Jânio Quadros, sumiu. Foi assim em 1993, quando Fernando Collor, apresentado ao povo como um ás da aviação, revelou-se apenas uma pomba gira. Meteu os pés pelas mãos e, mais do que isso, meteu a mão para valer. Antes que levasse o manche para casa, matando todos a bordo, foi obrigado a pular de pára-quedas. Por incrível que pareça, o avião pousou são e salvo. Mas a confiança nas tripulações de plantão ficara seriamente abalada. - Por que não trocar de aparelho e instituir o parlamentarismo? - perguntou, então, a elite, sempre criativa. - Se o regime de gabinete é assim tão bom, por que não se apelou para ele antes? - devolveu a esquerda, que já se via no poder, graças ao prestígio crescente de Lula e à desmoralização do campo adversário, na época. Puxa daqui, estica de lá, o povo desconfiou da mudança. Consultado num plebiscito, preferiu por larga maioria o velho presidencialismo - como, aliás, já havia feito em 1963, quando também lhe haviam indagado a opinião sobre o assunto. Mas o mundo dá voltas. Na undécima hora de seu semigoverno, Itamar Franco decidiu entregar o Ministério da Fazenda a Fernando Henrique, que, cercando-se de uma equipe competente, lançou o Plano Real, com o propósito de derrubar a inflação e estabilizar a moeda. O sucesso foi instantâneo, e a popularidade de FH deu um salto espetacular. E ele, que, meses antes, dificilmente se reelegeria senador por São Paulo, foi catapultado para a Presidência da República. O prestígio de Lula, que cometera a besteira de torcer o nariz para o Real, entrou em parafuso. O embate foi decidido no primeiro turno. Ato contínuo, nossa elite entrou em lua de mel com o presidencialismo, tanto que nenhuma voz levantou-se, então, para dizer que era chegado o momento de tirar o velho Sucatão do hangar - nem mesmo os tucanos, que, por formação e temperamento, sempre foram fervorosamente a favor do parlamentarismo. Todos enfiaram a viola no saco, sob o argumento de que era muito recente a decisão do plebiscito contra o regime de gabinete. Desconsiderá-la seria um desrespeito à democracia, quase um golpe. Não houve, porém, pruridos semelhantes em 1996, quando o governo FH já ia em meio. A elite viu-se diante de uma situação inusitada. Nunca o Brasil estivera entregue a piloto tão competente, e nunca, ao mesmo tempo, fora tão flagrante a falta de substitutos à sua altura. Quem poderia, com sorriso de aeromoça e mãos firmes, manter o país voando em céu de brigadeiro, rumo ao futuro, além de FH? Quem seria capaz de assumir sua cadeira e seguir comunicando-se diretamente, em cinco idiomas e vários dialetos, com as torres de comando do Primeiro Mundo? Ninguém. Mais fácil mexer na Constituição, introduzindo a possibilidade de o presidente disputar novo mandato, a exemplo do que se fizera em países vizinhos, como o Peru e a Argentina, de larga tradição democrática e sabidamente avessos a qualquer tipo de casuísmo. E, assim, mudou-se a Constituição, inaugurou-se a era das reeleições e reelegeu-se Fernando Henrique presidente da República. Não se ouviu, naquele instante, um pio a favor do parlamentarismo. Mas, como se disse acima, o mundo dá voltas - e nem sempre a favor do esquema político dominante. Mal fora empossado para um segundo mandato, FH perpetrou uma desastrada desvalorização cambial, o país entrou em pânico e o Real ingressou numa zona de fortíssimas turbulências. Resultado: a popularidade do presidente esborrachou-se de encontro à realidade. Quem garante que ele conseguirá juntar os cacos a tempo de o Palácio do Planalto influir decisivamente no processo sucessório? Na dúvida, é melhor abrir o leque de alternativas. Talvez seja possível produzir um candidato situacionista viável, capaz de derrotar as esquerdas em 2002. Nesse caso, aos olhos da elite, o presidencialismo terá demonstrado, mais uma vez, sua força e vigência. Mas pode ser também que a coalizão governista fragmente-se, não logrando chegar ao segundo turno em condições de vitória. Se essa hipótese vier a se verificar, não seria um mau negócio ter à mão a carta da mudança do sistema de governo. Nunca se sabe o jogo que será preciso jogar. É por isso que a emenda parlamentarista, de uma hora para outra, deixou a oficina de manutenção e passou a taxiar na pista. Podem seus autores e apoiadores declarar-se parlamentaristas de convicção, mas dificilmente convencerão o país de que não se trata de um expediente de ocasião, voltado para as eleições de 2002, a menos que deixem claro, desde já, que: a) a mudança só entraria em vigor depois de 2006 e, de forma alguma, afetaria as condições em que o próximo presidente exerceria seu mandato; b) o povo seria chamado a se manifestar em plebiscito sobre o sistema de governo de sua preferência, como fez 1993. Atendidas essas duas preliminares, será possível uma discussão séria sobre as vantagens e desvantagens do presidencialismo e do parlamentarismo. Caso contrário, tudo não passará de mais um casuísmo, que, seguindo-se ao da reeleição de FH, dificilmente conseguirá a adesão da opinião pública. Gato escaldado, como se sabe, tem medo até de água fria. Jornal de Brasília, 30/12/1999

Polêmica sobre as ONGs


11.06.1996



Excesso de peso - O Globo, 11/06/1996 As ONGs e a democracia por Herbert de Souza - O Globo, 27/6/1996 ONGs pra que te quero - O Globo, 06/1996 Debate condena excesso de autonomia das ONGs - O Globo, 08/1996 Excesso de peso - O Globo, 11/06/1996 Nas próximas duas semanas, enquanto o titular desta coluna visita São Petersburgo, estaremos juntos, caro leitor ou cara leitora. Na volta, Márcio Moreira Alves, com o talento e a verve de sempre, certamente nos dirá com quantas máfias russas se faz um capitalismo. É uma dúvida que perturba os estudiosos da matéria. Enquanto isso, ficaremos aqui tratando de temas nacionais, sabidamente mais amenos e menos complexos. Começo por dona Ruth e pelas ONGs. De Istambul, onde se encontrava presidindo a delegação brasileira à Habitat II, a mulher do presidente Fernando Henrique criticou as organizações não-governamentais brasileiras. - As ONGs, que tiveram um papel atuante no combate à ditadura, não dedicam a mesma energia à tarefa de erradicar a miséria no Brasil. Elas têm medo de ser cooptadas pelo Governo. É um estilo das ONGs ser contra o Governo –disse dona Ruth. Ela está mordida com a atitude das entidades que, há algumas semanas, deixaram o Conselho do Comunidade Solidária, acusando o Governo de não ter políticas sociais. Embora a crítica seja procedente, dona Ruth tem razão de estar irritada com as ONGs, que vêm tendo um comportamento ambíguo na sua relação com o Estado. Querem o bônus, mas não o ônus da parceria com o Estado. As ONGs brasileiras, em sua maioria, nasceram no período de luta contra a ditadura. Numa primeira fase, concentraram-se no trabalho assistencial ou nas denúncias das arbitrariedades cometidas pelo regime militar. Num segundo momento, partiram para a realização de projetos de desenvolvimento. Em alguns casos, chegaram a assumir certas funções na área social próprias do Estado. Mas colocavam-se à margem dele. Na terceira etapa, a atual, as ONGs mais poderosas vêm procurando influenciar diretamente a política do Estado. Pelo menos na área social, elas hoje têm assento num grande número de conselhos, semelhantes ao Comunidade Solidária, que deliberam sobre políticas públicas, e planejam e controlam sua execução. Em áreas como ação social, direitos da mulher, proteção ao menor, saúde etc, nada se aprova de importante sem passar pelo crivo de algumas dezenas de ONGs - na prática, mais poderosas e influentes que muito deputado e senador. Se, nas duas primeiras fases, nossas ONGs viveram quase que exclusivamente do financiamento de órgãos internacionais, à medida que se tornaram parceiras do Governo passaram a depender cada vez mais de verbas públicas. Pesquisa feita recentemente pela Associação Brasileira de ONGs, citada pelos repórteres Xico Sá e Abnor Gondim, da ''Folha de S. Paulo'', atesta que atualmente 70% das suas filiadas recebem recursos de órgãos públicos. Há dois anos, 80% do orçamento do Ibase, dirigido por Herbert de Souza, o Betinho, eram bancados por contribuições externas, percentual que se reduziu a 30%. Em contrapartida, a participação de verbas federais no custeio dos gastos do instituto superou, no ano passado, 15%. No entanto, apesar de deliberarem sobre as políticas do Estado em diversas áreas e de serem mantidas, em boa medida, com recursos públicos, as ONGs não se sentem parceiras do Estado. Tampouco se consideram responsáveis pelas ações que ajudam a aprovar. De um lado, estaria o Estado, com todas as suas mazelas: ineficiência, clientelismo, corporativismo, corrupção, lentidão, burocracia, impermeabilidade aos interesse populares etc. De outro, uma sociedade civil idealizada, em que só há qualidades: eficiência, interesses legítimos, espírito público, honestidade, agilidade, criatividade e compreensão do que o povo quer. As ONGs julgam que falam em nome desse paraíso perdido. O Estado seria o Mal. Ora, o mundo é um pouquinho mais complicado do que essa pieguice. Pilantras e picaretas, assim como gente séria e competente, existem dos dois lados da fronteira. A diferença é que, no caso do Estado, as pessoas que o dirigem são obrigadas a prestar contas regularmente à sociedade. Podem ser afastadas através de eleições periódicas. Esse sistema certamente não é perfeito e falha com freqüência, mas ainda não inventaram outro melhor. Se o deputado ou o senador deixou a desejar, rua com ele. Se o presidente ou o governador decepcionou, que se vote na oposição. Mas a quem as ONGs prestam contas? Se aplicam mal os recursos de que dispõem, apostam em prioridades erradas, apoiam projetos atrapalhados, gastam mais com seus funcionários do que com sua clientela, quem lhes dará o cartão amarelo ou vermelho? No Primeiro Mundo, essa tarefa cabe aos filiados das ONGs, que se contam aos milhões. A Sociedade Real de Proteção aos Pássaros, na Grã-Bretanha, por exemplo, tem 800 mil sócios, mais que todos os partidos políticos britânicos juntos. Só na Califórnia, dois milhões de pessoas têm carteirinha de alguma ONG, dez vezes mais que o total de militantes dos partidos Democrata e Republicano. Estima-se que um em cada dois americanos preste serviços voluntários em uma dessas entidades e 70 milhões contribuam financeiramente com elas. Apesar disso, as ONGs americanas não se arvoram a representar a sociedade americana. Em nome dela, falam os congressistas e o presidente da República. Por que no Brasil, onde as ONGs geralmente representam pouco mais do que o seu corpo de funcionários e ainda usam fraldas, elas são consideradas, inclusive por dona Ruth, representantes da sociedade civil? Como diria Macunaíma: - Ai! Que preguiça! As ONGs e a democracia - por Herbert de Souza - O Globo, 27/6/1996 A coluna do jornalista Franklin Martins, publicada no dia 11 de junho no GLOBO, é um belo exemplo do que se sabe e do que não se sabe a respeito das Organizações Não-Governamentais. É também uma mostra da série de idéias preconcebidas em torno do assunto que resistem bravamente a inúmeros esforços de elucidação. Franklin sabe da importância das ONGs e de sua história e relaciona a existência das mesmas ao processo de luta pela democracia no Brasil. No entanto, prefere valorizar o tempo em que as ONGs eram oposição ao Governo - não-governamentais em todos os sentidos. Com o processo de democratização muda o quadro e o contexto político do país, o que também redireciona os desafios a serem enfrentados pelas ONGs. A partir dessas mudanças, o jornalista levanta questionamentos que merecem ser debatidos não somente entre nós, ONGs, mas com o público em geral e de preferência em debates abertos à participação de outros atores sociais. As ONGs são acusadas de terem um comportamento ambíguo em relação ao Governo, de desejarem o bônus, mas não o ônus da parceria com este. Na verdade, uma boa parte das ONGs não se deu conta ainda de que as relações com o poder público fazem parte do processo democrático e, como toda relação, apresenta pontos de encontro e desencontro, de apoio e de crítica. Isso se deve ao fato de que as ONGs não são partes do Governo ou neogovernamentais como afirma o sociólogo FH. Como outras entidades da sociedade civil, as ONGs prezam muito a sua autonomia. O fato de receberem subsídios de quaisquer esferas governamentais não as transforma em parceiras fiéis do Governo nem em opositoras sistemáticas que apenas utilizam os recursos públicos de maneira oportunista. As relações com o poder são sempre problemáticas e conflituosas. Assim é a política e não seria diferente no caso das ONGs. As ONGs vêm procurando influenciar diretamente a política do Estado, assim como qualquer ator social, instituição ou simples cidadão que trabalha poderia fazer. Influenciar a política do Estado faz parte do processo democrático. É preciso exercer a cidadania em todos os níveis e não ser simplesmente objeto passivo diante de qualquer tipo de poder. Essa busca de participação e o esforço para influenciar as políticas públicas é uma virtude e não um defeito. Durante a ditadura militar, não era possível buscar fundos públicos para as atividades das ONGs, prática que já era corrente em todos os outros países democráticos do mundo. Por isso mais de 80% das verbas recebidas vinham do exterior, fato que acontecia também com o Ibase. Hoje o quadro é bem diferente. Buscamos apoio financeiro tanto junto às empresas como junto aos diferentes níveis de poder (federal, estadual e municipal). É importante dizer que grande parte dos recursos conseguidos pelo Ibase junto a órgãos e empresas públicas chega sob a forma de publicidade em nossos veículos de divulgação (jornal, revista, programas de rádio e TV). É claro que existem ONGs boas e ruins. Não temos a pretensão de sermos os bons da sociedade civil em contraposição aos maus. Esse tempo do maniqueísmo ideológico está superado, pelo menos para muitas de nós, ONGs que lutam pela sobrevivência a cada mês e ano. Uma das acusações mais freqüentes contra as ONGs é a de não prestarmos contas de nossas ações e principalmente dos recursos que recebemos. Somos vistos como entidades que pairam sobre a sociedade e que de certa forma são irresponsáveis. Mas se existem entidades que prestam contas de tudo que recebem, estas são exatamente as ONGs: todas as agências de financiamento, todos os projetos financiados exigem prestação de contas para continuarem suas contribuições. Além dos relatórios anuais onde se apresenta a prestação de contas de tudo que foi recebido e gasto, ainda existem prestações de contas por projeto para as agências que os financiaram, sem falar nas auditorias independentes solicitadas pelas grandes agências de cooperação. As operações de câmbio das ONGs são registradas no Banco Central e as contas estão abertas a qualquer consulta que se queira fazer. No contexto brasileiro, se compararmos a qualidade de prestação de contas, veremos que a das ONGs é mais rigorosa do que aquela aplicada a outras instituições, sejam elas públicas ou privadas. Outra pergunta que sempre surge é: a quem as ONGs representam? Essa questão pressupõe interrogar alguns fundamentos das sociedades democráticas. A quem representa o cidadão? Em nome de quem posso falar ou lutar? Em nome de quem posso propor, criticar, sugerir? Poderei eu como cidadão falar em nome de ideais, de projetos, de utopias, de valores? Aposto que sim. O cidadão é quem funda o poder do Estado. Não é o Estado que lhe dá legitimidade ou autorização para existir como cidadão livre e autônomo. Só em uma ordem autoritária isso acontece, e esse tempo já acabou ou já deveria ter acabado. As ONGs constituem sociedades civis organizadas em torno de valores, objetivos e idéias. Elas são constituídas por um conjunto de pessoas que compartilham esses objetivos. A ONG expressa uma forma de cidadania ampliada, organizada para a ação e não pretende substituir nenhuma das entidades existentes: partidos políticos, sindicatos, universidades, igrejas, governos. Mas como todo o mundo, tem suas posições políticas, realiza estudos e pesquisas, tem suas crenças e experimenta processos de cooperação ou conflito com os diferentes níveis do poder. Nesse sentido as ONGs não constituem um problema para a democracia, mas um avanço no desenvolvimento dos processos democráticos, pois oferecem outras formas de participação num mundo cada vez mais complexo e diversificado. As ONGs não devem ser superestimadas nem ignoradas. Elas constituem uma realidade no mundo inteiro que precisa ser cada vez mais conhecida para não ser discriminada por preconceito ou desinformação. Finalmente, é fundamental que as ONGs sejam cada vez mais entidades públicas, transparentes, com afiliados, associados, amigos, colaboradores voluntários, fiscalizadas pela sociedade e pelo poder público de forma sistemática e não, como às vezes se tenta fazer, em forma de represália quando elas incomodam com suas críticas à autoridade de turno. É por tudo isso que o artigo de Franklin Martins merece ser debatido em uma sessão aberta ao público porque interessa a todos e principalmente ao processo democrático deste país. HERBERT DE SOUZA é diretor-geral do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) e articulador nacional da Ação da Cidadania contra a Miséria e pela Vida. ONGs pra que te quero - "O Globo" - Julho de 1996 Em recente coluna, fiz algumas observações sobre as Organizações Não-Governamentais (ONGs) e suas relações com o Estado, que desagradaram ao sociólogo Herbert de Souza, o Betinho. Na semana passada, ele publicou sua resposta aqui nesta página do GLOBO. Como o leitor pode não ter lido meu primeiro artigo, convém resumi-lo rapidamente antes de entrar na polêmica. Nele, inicialmente, fiz um breve histórico sobre a importância e a diversidade das ONGs. Em seguida, critiquei-as por manter uma relação ambígua com o Estado, já que participam diretamente das decisões sobre políticas públicas em diversas áreas e são mantidas, em boa medida, com recursos governamentais, mas não se sentem responsáveis pelas políticas que ajudam a aprovar. Depois, classifiquei como equivocada a visão de que as ONGs são um modelo de eficiência, honestidade, espírito público e compreensão das necessidades do povo, em oposição a um Estado ineficiente, corrupto, corporativo e impermeável aos interesses populares. Pilantras e picaretas, assim como gente séria e competente, existem dos dois lados da fronteira, disse eu então. Lembrei também que, pelo menos, as pessoas que dirigem o Estado são obrigadas regularmente a prestar contas de seus atos à sociedade, podendo ser afastadas de suas funções pelo voto. No caso das ONGs, quando muito, esse controle é efetuado pelos sócios das entidades, que, no Brasil, não costumam ser muitos. Por último, disse que é um grave erro considerar essas entidades representantes da sociedade. Quem representa o povo são aqueles que ele elege através do voto. Betinho acusou-me de valorizar a fase em que as ONGs eram oposição ao Governo, como se eu fosse contrário a que elas mantivessem uma relação de parceria com o Estado. Não é essa a minha visão e, em momento algum, isso foi dito em minha coluna. Não só não considero um pecado que as entidades mantenham uma parceria com o Estado, como acredito que, dentro de determinados limites, ela é boa para ambos - e para a sociedade como um todo. Pode oxigenar o Estado e dar responsabilidade às ONGs. A questão está em definir quais são esses limites. Há algum tempo, durante um almoço, Betinho disse-me que a relação das ONGs com o Estado deveria ser como a da formiguinha que pica o elefante para que ele se mexa. A imagem é boa. Outras também ilustrariam bem a situação: as entidades não-governamentais seriam abelhas que azucrinam o paquiderme ou camundongos que o assustam. Todas essas imagens têm algo em comum: reconhecem que, por mais próximas que estejam do Estado, as ONGs são externas a ele. Podem estimulá-lo a ir num ou noutro sentido, mas não podem se propor a dirigi-lo. O elefante deve andar com as próprias patas e decidir com a própria cabeça. Só quem pode governar o Estado é quem foi eleito pelo povo para isso. Parece óbvio, mas não é. Atualmente, em particular na área social do Estado, as ONGs têm assento em numerosos conselhos que discutem questões como ação social, direitos da mulher, proteção ao menor, saúde, etc. Geralmente, elas detêm metade das cadeiras desses fóruns e, muitas vezes, comandam suas decisões. Isso não chega a ser um problema grave quando os conselhos têm caráter consultivo, porque, em última instância, o Governo pode ou não aceitar as sugestões. Mantém a última palavra. Mas há casos em que os conselhos assumiram funções deliberativas, não só aprovando as políticas públicas da área, como tentando controlar sua execução. Trata-se claramente de uma exorbitância, pois essa tarefa cabe ao Legislativo e ao Executivo, que emanam do voto popular, e não às ONGs. Por mais bem-intencionadas que sejam, elas não representam a sociedade. Betinho sabe disso. Tanto que sai pela tangente no assunto. Diz que qualquer cidadão pode falar em nome de utopias e que as ONGs são uma forma de cidadania ampliada. E conclui com uma generalidade: "O cidadão é quem funda o poder do Estado. Não é o Estado quem lhe dá legitimidade ou autorização para existir como cidadão livre e autônomo". O sociólogo confunde duas coisas diferentes: liberdade de pensamento, de expressão e de manifestação com representação política. Qualquer um de nós tem o direito de pensar, propor, criticar, sugerir e apoiar o que quiser. Mas não tem o direito de se arvorar em representante de outras pessoas, a menos que tenha recebido um mandato expresso nesse sentido. Por outro lado, se é verdade que, nas democracias, o cidadão funda o poder do Estado, ele o faz coletivamente, através de voto universal, livre e secreto. Isso quer dizer que sociedades civis organizadas em torno de determinados valores, idéias, utopias ou mesmo ressentimentos não devam existir? Claro que não. Elas são extremamente importantes: lubrificam a circulação de idéias, organizam as pressões, chamam a atenção para problemas ainda encobertos, atuam como um fermento social. Mas não substituem o voto e, especificamente, o Parlamento. É no Parlamento que se afirma a representação política e nele que se dirimem os conflitos de interesse na sociedade democrática. A ele cabe definir as políticas públicas e controlar sua execução. Outras instâncias podem coadjuvá-lo nessa tarefa, mas nunca substituí-lo. Se as ONGs, em sua parceria com o Estado, não ultrapassarem esta linha, 90% da polêmica estará resolvida. A preocupação de Betinho é de que as ONGs não percam sua autonomia diante do Estado. A minha é outra: de que o voto, através do qual o cidadão funda o poder do Estado, não perca sua substância. Pode-se argumentar que nossas instituições parlamentares são muito ruins e freqüentemente não funcionam a contento. É verdade. Mas isso é sinal de que elas precisam ser reformadas e não contornadas. Nossa democracia certamente será melhor quando o voto de um paulista não valer um dezesseis avos do voto de um acreano, quando dois partidos com percentual idêntico nas eleições parlamentares, como ocorreu com o PFL e o PT em 1994 (14%), tiverem o mesmo número de deputados e não um o dobro do outro, e quando o sistema eleitoral deixar de combinar voto proporcional com listas abertas, enfraquecendo o controle do eleitor e do partido sobre o parlamentar e deixando-o à vontade para fazer o que lhe der na telha. O que isso tem a ver com as ONGs? Para mim, tudo. As ONGs só poderão ser realmente fortes numa democracia consolidada, com regras claras e com a essência da vontade do eleitor respeitada - e não apenas a aparência. Esse é um debate que eu gostaria de travar com Betinho, porque espanta-me o silêncio das ONGs sobre o assunto. Ou será que elas acham que as reformas políticas só interessam aos políticos profissionais? Debate condena excesso de autonomia das ONGs - O Globo - Agosto de 1996 As organizações não-governamentais foram o tema do debate na noite de terça-feira, no auditório do “O Globo”, convocado a pedido do sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, com o cientista político Wanderley Guilherme dos Santos e o diretor do “O Globo” em Brasília, Franklin Martins. O debate foi a forma encontrada por Betinho de ampliar uma polêmica travada por ele e Franklin em artigos publicados no jornal entre junho e julho. Tanto nos artigos como no debate, Franklin defendeu a tese de que as ONGs, ao participar de maneira agressiva e até certo ponto orquestrada dos conselhos deliberativos que se multiplicam em todas as instâncias de governo, atentam contra a democracia representativa. Franklin Martins, Wanderley Guilherme e Betinho concordaram que as ONGs ocupam espaços deixados vagos pela representação política tradicional, num mundo que cresce de forma vertiginosa, se diversifica e se fragmenta, multiplicando grupos de interesse. Franklin alertou para o perigo, a pretexto de dar voz a esses interesses fragmentados, se criarem condições para que a vontade de pequenos grupos seja imposta e o voto, base da democracia, acabe relativizado e deixado de lado. - O importante é que exista um terreno comum a esses diversos interesses onde haja a confrontação – defendeu o jornalista. – A meu ver, esse lugar é o Parlamento se organiza pelo voto. Qualquer tentativa de contornar o Parlamento, ou de achar que se definem políticas públicas sem passar por ele, não é uma atitude democrática. Isso investiria contra a essência do Estado democrático, que é o voto. Para Franklin, a participação das ONGs nos conselhos, quando ultrapassa os limites de um simples grupo de pressão ou de assessoramento, é delicada. O jornalista acredita que, ao se apresentar como representante da sociedade civil – para o que, ele destaca, elas não teria qualquer delegação – e participar de reuniões com direito a voto, as ONGs negam o sistema representativo. - E não vejo a menor autoridade para que falem em nome da sociedade. Quem fala em nome da sociedade é quem tem voto para isso – destacou. A possibilidade de contornar o Parlamento, para Franklin, cria ainda um segundo desdobramento negativo. Quando as ONGs influenciam e até decidem o que deve ser feito pelo Governo, encontram uma forma mais palatável de conviver com as mazelas da democracia, em vez de apontar claramente os problemas e pressionar por uma reforma do Estado. E, sem reformar as instituições democráticas, nenhuma decisão conquistada nos conselhos terá duração nem conseqüências. Betinho disse que as instituições tradicionais perderam a capacidade de representar todos os interesses da sociedade moderna. Defendeu também que quem funda o Estado democrático é a sociedade, mas não necessariamente – ou exclusivamente – pelo voto. Para o sociológico não é quantidade que define a qualidade da representação. Ele concordou que o sistema democrático e o voto são uma conquista. Mas lembrou que absolutizar o voto como fundamento do Estado e da democracia é um risco. Para Betinho, o Brasil estaria vivendo um sistema de voto que, ao contrário de ser uma virtude, é um entrave aos avanços sociais. E concordou com Franklin que é necessário mudar o sistema de voto. Para ele, contudo, a reforma política do Estado e a defesa do Parlamento têm que passar por um crítica constante. - Um parlamento que é cúmplice do estado de miséria e que jamais foi capaz de discutir as questões centrais da concentração de renda precisa ser muito mais questionado. Quanto mais criticado ele for, mais vamos colaborar para que seja instrumento da democracia – afirmou Betinho ao justificar o papel assumido pelas ONGs. Para Betinho, o papel das ONGs é lembrar que a política não se faz simplesmente seguindo manuais vigentes em outras épocas. E lembrou que não são as ONGs que fragmentam a sociedade, mas a sociedade que fragmenta as ONGs. E que elas seriam vítimas dessa fragmentação. O ponto mais produtivo do debate foi quando Betinho admitiu que as idéias defendidas por Franklin o haviam deixando “pensativo em relação à questão dos conselhos”. Para o sociólogo, na verdade, o que estaria acontecendo seria uma duplicidade de poder. Segundo ele, caberia, por exemplo, à Câmara dos Vereadores definir as políticas e investimentos do município. Um conselho municipal não deveria decidir sobre essas políticas. Segundo o sociólogo, até hoje as ONGs estavam trabalhando com a idéia de que os conselhos seriam uma contribuição ao processo democrático por ampliar a participação nos processo decisórios. Betinho admitiu, porém, que Franklin estaria levantando um problema sério: de que não se trataria de participação, mas de decisão. Alguns conselhos, lembrou Betinho, são apenas consultivos, mas outros, admitiu, são deliberativos. Nesse ponto, reconheceu que estaria havendo uma duplicidade de poder por parte dessas organizações. Mas lembrou que, ainda assim isso não estaria sendo aproveitado apenas pelas ONGs. - De qualquer forma, uma coisa é influenciar políticas, outra coisa é deliberar sobre políticas. E, se queremos manter linha de coerência com o Estado representativo, fundado no voto, essa é uma questão a ser considerada – admitiu. Wanderley Guilherme dos Santos, embora tenha se destacado que as ONGs desempenham um papel relevante, concorda com as inquietações de Franklin Martins. Segundo ele, as instituições históricas democráticas precisariam de complementação, sob pena de desmoralizar a idéias de democracia. E destacou que não seria o caso de, “por conta de falhas aqui e acolá”, desestimular as forças que estão surgindo. Mas, para ele, também não seria o caso de considerar que as ONGs, porque têm boas intenções, alcançam resultados necessariamente bons e importantes.

Prefácio do livro "Valeu a pena"


01.08.1996



Ao retirar-se da atividade política, ainda na década de 80, meu pai pretendia escrever suas memórias, mas, por uma razão ou por outra, o livro não avançou, empacando na fase das anotações e no manuscrito do primeiro capítulo. Mais tarde, com problemas de visão, passou a ter dificuldades para ler e escrever. Assim, na festa dos seus 80 anos, meus irmãos e eu sugerimos a contratação de um jornalista para auxiliá-lo no livro. A princípio, ele pareceu aceitar a idéia. Mas, meses depois, quando viu que ela era para valer, fulminou-a: - Com tanto filho jornalista, por que contratar alguém de fora da família? Não me sinto à vontade falando sobre a minha vida com um estranho. O recado não podia ser mais claro: um de nós teria de assumir pessoalmente a empreitada. Assim, em janeiro de 1994, ao viajar de férias para o Espírito Santo, levei comigo o gravador, o computador e a disposição de ajudá-lo a trazer ao mundo seu livro de memórias. No início, ele sentiu-se pouco à vontade, mas, aos poucos, desencabulou. Durante todo aquele mês, três vezes por semana, trabalhamos juntos no escritório de sua casa em Vila Velha. Logo estabelecemos uma rotina: eu lia o rascunho dos capítulos que escrevera nos dias anteriores com base nos depoimentos gravados, e ele propunha alterações, correções e acréscimos; eu expunha minhas dúvidas sobre o que me parecia obscuro ou confuso, ele as esclarecia e acrescentava novos detalhes; em seguida, ligávamos o gravador e retomávamos os depoimentos. Janeiro, é claro, não foi suficiente para terminar o trabalho. Tive de voltar mais quatro vezes ao Espírito Santo naquele ano, aproveitando feriadões. Em julho, concluímos a gravação dos depoimentos. Em setembro, durante a Semana da Pátria, tivemos nossa última sessão de trabalho, quando ele reviu os capítulos escritos até aquela época, mais ou menos o equivalente a quatro quintos do total que o livro teria ao final. Ele já estava bem cansado e sabia que não teria muito mais tempo pela frente. Morreu dormindo três meses depois, no dia 11 de dezembro de 1994. Desde o início, combinamos que o livro fugiria do padrão usual nas memórias dos políticos, em que as citações de discursos, os artigos de jornal e as argumentações em torno de polêmicas partidárias acabam soterrando a vida que se quer contar. Para meu pai, o livro deveria ser um passeio por sua vida e seu tempo - recheado, portanto, de casos e episódios, de lembranças de pessoas importantes e de gente humilde, de sonhos e de desilusões, de lutas e de momentos alegres. Tão importante quanto falar de sua participação no Senado seria recordar seus tempos de pugilista amador. Tão interessante quanto discorrer sobre sua atividade como vereador ou deputado seria escrever sobre Louise, sua namorada francesa na Zona do Mangue, ou sobre seus amigos de boêmia, como Orestes Barbosa e Ismael Silva. Tão significativo quanto relembrar sua renúncia ao mandato de deputado, a cassação política ou as sete vezes em que foi preso durante o Estado Novo e a ditadura militar seria falar sobre os pescadores de Manguinhos ou sobre seus encontros com Churchill ou Kruschev. Tudo isso sem esquecer dos colegas de profissão e das redações dos jornais em que trabalhou, do início dos anos 30 até a década de 70. Porque meu pai, embora tenha sido vereador, deputado federal e senador, mais do que um político, foi um jornalista. Gostava do Parlamento, mas sentia-se em casa mesmo era numa redação de jornal. Seja como político, seja como jornalista, ele sempre esteve na oposição. Nunca conseguiu ser governo, um pouco pelas circunstâncias políticas da época, mas muito pela sua personalidade. O fato é que desconfiava do poder e amava a rebeldia; desprezava a pose e a bajulação e encantava-se com quem remava contra a corrente. Mas, se sempre foi de oposição, nunca foi do contra. É que tinha um enorme apetite pela vida. Talvez essa tenha sido sua marca registrada: a alegria de viver. É curioso: quando comecei a trabalhar com ele no livro, não tinha tanta consciência de que esse era o traço marcante de sua personalidade. Pois o gosto pelo mundo e pelas pessoas era algo tão natural nele, que, ao menos para nós, da família, terminava não se destacando. Confundia-se com ele. Foi conversando com os outros, ao checar episódios e detalhes do livro, que percebi que o que nos parecia natural era, na verdade, uma marca extraordinária. Pois se um elogiava sua integridade, outro a coragem pessoal, um terceiro a inteligência, um quarto a lealdade, e assim por diante, todos, ou quase todos, depois de prestar tributos a essas qualidades, digamos, públicas de meu pai, acrescentavam, como quem revela um segredo ou confessa uma inveja: "Mas o que mais me fascinava nele era o gosto que tinha pela vida". Relendo suas memórias, agora que elas vão para a editora, constato como essa observação é verdadeira. Algumas explicações são necessárias sobre este livro. O primeiro capítulo foi escrito diretamente por meu pai, anos antes do restante da obra. Em termos de estilo, é diferente dos demais - a meu ver, é o mais elegante. Os outros foram escritos por mim, com base nos depoimentos gravados, tendo ele revisto o texto até o capítulo 43, inclusive. Pelos onze últimos capítulos, que não passaram pelo seu crivo, assumo inteira responsabilidade. Estou seguro de que ele os aprovaria sem modificações significativas. Como ghost-writer, procurei, ao máximo, manter as palavras, as expressões e o ritmo dos depoimentos. Meu pai era um excelente contador de casos e seria um crime não aproveitar esse dom na hora de contar a história de sua vida. Mas, ao mesmo tempo, tratei de fugir do estilo falado, que talvez desse mais sabor às primeiras cem linhas do texto, mas, ao longo de duzentas e tantas páginas, tornaria a leitura extremamente cansativa. Embora meu pai fosse dotado de uma memória prodigiosa, sobre a qual ele falará neste livro, não confiei cegamente nela. Sempre que surgiram dúvidas sobre algum episódio, detalhe, data etc., consultei outras fontes. Mesmo assim, é possível que, aqui e ali, uma ou outra imprecisão tenha escapado. Peço desculpas antecipadamente. Além disso, existirão outras versões para alguns episódios aqui narrados. Nesse caso, consolo-me com a observação clássica de que um livro de memórias é apenas um testemunho e, como todo testemunho, é tão-somente uma das muitas visões possíveis da realidade. Praticamente todos os meus irmãos, de uma forma ou de outra, trabalharam neste livro. Alguns ajudaram a tomar os depoimentos, outros reuniram fotos, jornais, documentos. Todos leram os originais e propuseram adendos e correções. Minha mulher, Nisa, fez a revisão do texto final e, mais do que isso, estimulou-me a concluir a tarefa quando pensei em abandoná-la depois da morte de meu pai. Maria Célia Fraga e Cristina Konder, do Centro de Documentação e Informação de O Globo, foram gentilíssimas auxiliando-me na pesquisa de jornais e fotos. Sou grato a Barbosa Lima Sobrinho, Evandro Carlos de Andrade, Lúcia Hipólito, Márcio Moreira Alves, Mauro Santayanna e Zuenir Ventura por terem lido os originais e feito sugestões e críticas, e a Sérgio Marques e Paulo Moreira, pela ajuda na reprodução das fotografias de arquivo. Uma última explicação: como o leitor notará, falta ao livro o capítulo 51, que deveria tratar da separação de Mario e Dinah e do casamento de Mario com Jane. Meu pai pretendia escrevê-lo ele próprio. Minha mãe já tinha morrido, esses assuntos são sempre delicados e ele queria escolher bem as palavras para não ferir ninguém. Mas, não teve tempo. Foi uma pena. O mais importante, porém, é que Mario viveu 34 anos com Dinah, com quem foi feliz, e vinte anos com Jane, com quem também foi feliz. Teve nove filhos do primeiro casamento e dois do segundo. Todos nos damos bem. Assim, o livro sai sem esse capítulo, o que, de certa forma, é uma injustiça com Jane, Marianne e Paulo Mario, que tiveram uma presença muito maior e mais forte na vida de meu pai do que este livro retrata. É um problema que não pude superar. Para evitar que, pela ausência do capítulo, a narrativa fosse quebrada, incluí uma nota com algumas informações factuais sobre o assunto. Além disso, Paulo Mario escreveu um curto depoimento sobre papai, que sai como posfácio. Uma última observação: para mim, foi muito bom fazer este livro junto com ele. Saímos "à boêmia" - como costumávamos fazer aos domingos, quando ele chamava os filhos pequenos para passear de carro sem destino certo, confiando no acaso - e escrevemos a história de sua vida. As impressões de meu pai sobre este último passeio estão no próprio livro. Adianto apenas que se divertiu muito. Quanto a mim, gostei do que vi, do que lembrei, do que aprendi, do que descobri. Mais do que tudo, gostei da companhia. Valeu a pena. Brasília, agosto de 1996

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